Nas previsões da Organização Internacional do Trabalho serão entre 25 e 50 milhões os que neste ano arriscam perder o emprego no rescaldo da que é já hoje classificada, sem rodeios, como a mais severa recessão mundial do pós-guerra.
Não é, portanto, exagero esperar que meio mundo esteja hoje de nariz colado no écran, na expectativa de que de Londres saia a promessa, mesmo que conscientemente vã, de que a economia mundial vai dar a volta. E que vai dar a volta rapidamente.
Pela segunda vez no curto prazo de quatro meses, os líderes das maiores potenciais mundiais e dos países emergentes reúnem-se numa cimeira do G20 para traçar uma estratégia coordenada para sair desta crise e, simultaneamente, acertar agulhas para evitar que colapsos no sistema financeiro voltem a atirar a economia mundial para a vertigem de uma depressão.
A boa notícia de Londres é que, ao contrário do que sucedeu em Washington, será Barack Obama quem estará sentado à mesa a representar os Estados Unidos - e a sua genuína disponibilidade para construir compromissos tem sido dura e sistematicamente posta à prova, dentro e fora de fronteiras. Ontem voltou a prová-lo: "Venho aqui para apresentar propostas e para ouvir as dos outros - não venho para pregar".
A má notícia é que, de Novembro para cá, a degradação da situação económica global foi de tal forma vertiginosa que, em vez de mobilizar, parece ter ainda acentuado as clivagens. Nicolas Sarkozy, o temperamental presidente francês, voltou ontem ameaçar "partir a louça" se nesta cimeira não houver um compromisso firme em acabar com os paraísos fiscais - boa parte deles situados em territórios sob jurisdição britânica e norte-americana. "Não há três opções: ou se acaba com eles, ou não", disse ao lado da chanceler Angela Merkel, depois de ambos terem assegurado que França e Alemanha falarão no G20 "a uma só voz".
E é aqui que surge a primeira grande linha de clivagem entre os membros do G20. EUA, Reino Unido, Japão e, em certa medida, a própria China - todos já com planos de relançamento económico superiores a 4% do seu PIB, e mais arrojados do que o europeu (3,3%) - insistem que este não é o momento de pensar em estratégias de "prevenção de incêndios", quando se tem o chão a arder debaixo dos pés.
E o que é preciso é mobilizar mais recursos para reanimar a economia, travar o desemprego e o cenário de uma grande depressão mundial, mesmo que isso signifique a emergência de outras crises, orçamental ou de hiperinflação. Mas cada crise a seu tempo, argumentam, numa opinião que é, aliás, partilhada por Luís.
Alemanha e França, mas também Espanha, Holanda ou mesmo países como a Austrália e a África do Sul, vêem as prioridades praticamente invertidas. Argumentam que é preciso esperar para medir o impacto no "terreno" das medidas de reanimação já anunciadas, antes de pensar em mais endividamento público e de mais encargos para as gerações futuras.
E - mais importante - consideram prioritário disciplinar, com medidas e prazos concretos, os mercados financeiros, atacando de frente a inexistência de mecanismos de supervisão globais; e os territórios ("offshores") e produtos financeiros ("hedge funds") mais opacos. E fazem-no porque consideram que esta é uma crise de descrença no sector financeiro: quanto mais cedo for "remendado", mais cedo chegará a tão ansiada retoma.
"Neste momento, não existe uma estratégia consensual de resposta à crise financeira e a divisão aberta entre os Estados Unidos e a Alemanha pode prejudicar uma posição comum das democracias ocidentais sobre as reformas institucionais", adverte Carlos Gaspar, presidente do Instituto Português de Relações Internacionais".
Não obstante, Londres não pode falhar. Mesmo que entendimento tenha de ser alinhado por baixo. E que expectativas mais elevadas tenham de ser transferidas para um novo G20 - que, desde já, ficará, em Londres, marcado ainda para este ano.
Jornal de Negócios - 02.04.09
À procura de textos e pretextos, e dos seus contextos.
02/04/2009
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