Seja para estrangeiros ou para cidadãos nacionais, a capacidade de atracção de Portugal está em queda. As estimativas da população residente relativas a 2008, ontem divulgadas pelo Instituto Nacional de Estatística, mostram que o número de residentes que, no ano passado, decidiu abandonar o país mais que duplicou o patamar de 2001.
Há sete anos, com uma taxa de desemprego nos quatro por cento, foram 9800 os que procuraram outro destino para viver e trabalhar. Em 2008, com o desemprego nos 7,7 por cento, esta foi a escolha de 20.357 cidadãos.
Com 26.800 saídas, o salto para as dezenas de milhar fora dado um ano antes, mais do que triplicando as estimativas feitas pelo INE em 2003. Este aumento de saídas está a ser alimentado tanto por cidadãos nacionais que decidem emigrar, como pelo abandono de imigrantes que se tinham fixado em Portugal, frisa Pedro Góis, investigador do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra. Na Europa, até há muito pouco tempo, esta era uma "especificidade" portuguesa, adianta. Ou seja, Portugal era um "caso único" nesta dupla composição dos fluxos de saída.
Como não existem registos exactos do fluxo de saídas, os dados do INE são apenas estimativas. O que quer dizer que a realidade poderá ser pior.
"Estamos a perder população jovem, em idade activa, e isso é grave para o país", constata a demógrafa Filomena Mendes. A economista Nádia Simões, investigadora do centro Dinâmia do ISCTE, atribui este fenómeno à "degradação das condições do mercado de trabalho". Pedro Góis lembra que os efeitos da crise têm sido particularmente pesados nos sectores que habitualmente captavam mais mão-de-obra imigrante. Como, por exemplo, a construção civil, que, desde o boom de 2004, com a construção dos novos estádios de futebol, entre outras estruturas, "caiu para metade". E não são só os imigrantes que trabalhavam nas obras que partem. "Também muitos portugueses que estavam neste sector estão a ir embora", diz. Para esta mão-de-obra, Angola tem sido o ponto de destino que mais se tem destacado.
Novos emigrantes
Estes são os que não têm trabalho em Portugal e portanto vão procurá-lo noutro lado. Mas os fluxos de saída têm também sido alimentados por aqueles que, apesar de terem cá trabalho, preferem ir para fora. "Entre os novos emigrantes, há cada vez mais pessoas altamente qualificadas", frisa Nádia Simões. Para a economista, este é o fenómeno mais preocupante, já que, salienta, estas pessoas estão entre aquelas que têm "maiores capacidades para promoverem o desenvolvimento económico do país". "Saem os que têm maior capacidade de impulso e isso é bastante negativo."
"Simultaneamente, não estamos a conseguir atrair gente", constata Filomena Mendes. Desde a década de 90 que o crescimento da população residente tem sido feita sobretudo por conta do saldo migratório (diferença entre o número de entradas e saídas por migração). Por exemplo, para os cerca de 270 mil residentes a mais que Portugal ganhou entre 2002 e 2007, a componente migratória pesou 91 por cento. Mas em 2008 o número de novas entradas para efeitos de residência e trabalho ficou-se nos 29.718. Em 2002, tinham sido 79.300. Nesse ano, a diferença positiva entre os que chegaram e os que partiram foi de 70 mil. Em 2008, o saldo migratório ficou-se pelos 9361. Foi o valor mais baixo em mais de uma década.
"Isso não quer dizer que, quando a economia recuperar, Portugal não volte de novo a ser atractivo para os imigrantes", diz Pedro Góis, que, contudo, chama a atenção para uma mudança que entretanto se consumou. Dada a melhoria de condições nos seus países de origem e ao agravamento da crise por cá, nos novos fluxos de imigrantes praticamente desapareceram os cidadãos da Europa do Leste. Na imigração, estamos a regressar aos fluxos que eram tradicionais por cá, oriundos maioritariamente dos países de expressão portuguesa, constata o investigador.
Público.pt - 24.07.09
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