A controladora financeira do Ministério das Obras Públicas alertou o governo para os riscos inerentes ao contrato que concedeu à empresa privada Liscont por mais 27 anos a exploração do terminal de contentores de Alcântara. O negócio, que seria fechado em Outubro do ano passado, está agora a ser alvo de duras críticas por parte do Tribunal de Contas (TC), que no relatório de auditoria publicado esta semana o define como um mau exemplo para o sector público, com prejuízos para o Estado.
Mariana Abrantes de Sousa, especialista em parceiras-público privadas e controladora do ministério até Março deste ano, tinha como missão reportar ao ministro Mário Lino e ao ministro das Finanças - precisamente os dois representantes do governo que assinaram o contrato - sobre "iniciativas com impacto financeiro relevante de forma a alertar atempadamente para os respectivos problemas e desvios", estabelece a lei de 2006 que define as funções dos controladores financeiros. Esta figura foi criada pelo governo num quadro de crise orçamental, para reforçar o controlo interno das finanças públicas.
No contraditório à auditoria feita pelo TC, Mariana Abrantes de Sousa deixa claras as suas críticas e o alerta feito. "O agravamento dos rácios de cobertura de serviço de dívida exigidos pelos bancos e o forte aumento na TIR [taxa interna de rentabilidade] accionista no decurso das negociações são sinais de que o Concedente [Administração do Porto de Lisboa] passou a suportar cada vez mais risco, como foi previsto e alertado", assume Abrantes de Sousa.
A avaliação demolidora feita pela controladora - que desempenha agora a mesma função, mas na pasta da Saúde - foi sublinhada nas conclusões da auditoria do Tribunal de Contas (TC) e está repetida nas várias críticas feitas no exercício do contraditório. Mariana Abrantes de Sousa critica o desequilíbrio em termos de partilha do risco (em prejuízo do Estado), o facto de a equipa de negociação do Estado não ser da Parpública (mais experiente) e os riscos para a Administração do Porto de Lisboa (APL) "Os novos encargos e riscos para a APL como concedente parecem ter prejudicado a bancabilidade da APL, que pela primeira vez poderá ter de apresentar aval do Estado para obter financiamento de longo prazo", aponta Abrantes de Sousa.
Na resposta à auditoria do TC, Mariana Abrantes de Sousa, considera ainda que a opção por renegociar a "escassos sete anos" do termo do contrato, "por motivos de urgência, sem concorrência e sem critérios objectivos, foi uma opção relativamente arriscada". Juntando a conjuntura adversa, o contrato foi assinado em Outubro de 2008 em plena crise financeira, "resultou na degradação das condições do negócio que vão prejudicar a APL (Administração do Porto de Lisboa) como concedente durante 34 anos".
Ao i, Mariana Abrantes de Sousa preferiu não fazer comentários, remetendo para a lei que define as funções dos controladores financeiros. O Ministério das Obras Públicas - que está sem controlador financeiro desde a saída de Abrantes de Sousa, em Março desde ano - remeteu o i para o contraditório à auditoria do TC, assinado também pelo Ministério das Finanças.
A polémica sobre o negócio de prorrogação da concessão à Liscont - empresa do grupo Mota-Engil, liderada por Jorge Coelho - começou com as críticas do Tribunal de Contas no relatório preliminar de auditoria, críticas que foram mantidas e intensificadas na versão final apresentada esta semana. Segundo o TC há dois problemas centrais: o não lançamento de concurso para o prolongamento da concessão e as projecções sobre o tráfego de contentores entre 2009 e 2013, 75% superior ao tráfego real em 2008. O Correio da Manhã já noticiou que o Ministério Público - que recebeu, como sempre, o relatório do TC - está a preparar uma investigação ao caso.
A controladora, que deixou o Ministério das Obras Públicas em Março para desempenhar as mesmas funções no Ministério da Saúde, assinala também que apesar de ser um projecto estruturante, a "expansão do terminal não terá sido sujeito a consulta pública explítica, nem apresentado ou e aprovado no Parlamento", o que explica de alguma forma a contestação pública a posteriori. E critica as projecções de tráfego: "O concedente [APL] passou a assumir bastante mais risco de tráfego com encargos ou perda de receitas já a partir de 2009 ou 2010".
ionline.pt - 23.07.09
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