O dinheiro nem sempre chega para a comida. Dezenas de famílias carenciadas de Setúbal recorrem por isso ao apoio alimentar concedido todas as noites na Paróquia de Nossa Senhora da Conceição. Para muitas, esta ajuda é essencial para sobreviverem.
“É a única refeição que tenho. Já passei muitos dias sem comer nada. A minha sorte é vir aqui buscar alguma coisa, se não já tinha morrido à fome”, confessa António Baião, de 54 anos, desempregado há três, e a receber 130 euros mensais da assistência social.
Desde que ficou sem trabalho, após ter sido operado a um quisto no pulmão, que tem a renda da casa em atraso e vive sem água e luz no bairro da Bela Vista. “De um momento para o outro estou sujeito a ir para a rua. O que mais queria era arranjar trabalho para não ser um sem-abrigo. Podia ser que conseguisse dar volta à situação”, desabafa, dizendo que tem procurado trabalho sem sucesso.
As refeições quentes são distribuídas por voluntários da Associação Casa, numa parceria com a Cáritas de Nossa Senhora da Conceição, às pessoas carenciadas que procuram ajuda na paróquia. Como estão divididos em dois grupos, cada agregado familiar, num total de 38, tem acesso dia sim, dia não às refeições quentes cedidas por meia dúzia de estabelecimentos de restauração.
Maria Grilo, de 35 anos, é uma das mais recentes beneficiárias. Com três filhos para sustentar, de 9, 13 e 16 anos, recebe mensalmente 417 euros de Rendimento Social de Inserção, que não chegam para tudo. “Tenho de esticar o dinheiro ao máximo, porque tenho uma renda de 350 euros para pagar, fora as outras despesas”, conta a desempregada há dois anos.
“Se não fosse esta ajuda muitos dias não tinha mesmo nada. Dão todo o tipo de comida e também servem sopa, fruta, bolos e pão. Quando não é o meu dia e eu não tenho nada, ligo e também me ajudam”, enaltece, amargurada por não conseguir arranjar trabalho.“Levo comer para quatro pessoas. Com um bocado de cada coisa vamos comendo. Fome não tenho passado”, observa também a reformada Maria do Carmo Ramos, de 77 anos, que reside em casa de um filho na Bela Vista.
Considerado essencial, este apoio alimentar é prestado desde 14 de Março de 2009. “Até podem nem passar fome, mas ao darmos comida não a compram e conseguem liquidar dívidas ou comprar medicamentos”, realça Luísa Leitão, responsável da Associação Casa em Setúbal.
“Já temos cerca de 150 pessoas a beneficiar destas refeições. É uma necessidade muito grande que tem vindo a crescer”, salienta o padre Constantino Alves, explicando tratar-se de dependentes, sem-abrigo ou pessoas atingidas pela crise e que perderam o emprego.
No distrito de Setúbal, as refeições são servidas também em Azeitão e no Barreiro, abrangendo quase 400 pessoas. “São potenciais sem-abrigo”, nota Rogério Figueira, vice-presidente da Casa, que tem outras parcerias em Lisboa, Porto, Coimbra, Funchal, Faro e Cascais. “Há cada vez mais necessitados. Em Faro, por exemplo, de um momento para o outro passámos de 60 para 400 pessoas”, recorda.
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