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27/11/2009

Recibos Verdes - Antes da dívida temos direitos!

A deterioração das relações laborais avança em Portugal a um ritmo avassalador, com perda de direitos e erosão das condições de vida para sectores cada vez mais vastos da população. A par do aumento do desemprego, há hoje cerca de 2 milhões de pessoas em situação de precariedade, sujeitas à arbitrariedade dos patrões, obrigadas a aceitar os baixos salários e a incerteza, à margem do enquadramento legal, da protecção social e das garantias mínimas. A chantagem social individualiza as relações laborais para enfraquecer a parte mais fraca: os trabalhadores/as.

Assistimos à generalização da contratualização a prazo para funções permanentes, à vulgarização dos recibos verdes, ao crescimento do negócio das empresas de trabalho temporário, à transformação dos/as trabalhadores/as em “colaboradores/as”, sempre disponíveis e descartáveis.

O trabalho a recibos verdes é disso um bom exemplo: estima-se que existam hoje em Portugal cerca de 900 mil falsos recibos verdes, a desempenhar funções permanentes, com horário, local de trabalho e hierarquia reconhecíveis, mas sem qualquer contrato ou reconhecimento de direitos.

O Estado, que deveria ter uma responsabilidade especial nesta matéria - desde logo fiscalizando e impedindo esta chantagem ilegal sobre um conjunto cada vez maior de trabalhadores/as -, é o primeiro a não dar o exemplo: além dos meios insuficientes fornecidos à Autoridade para as Condições do Trabalho, há já hoje mais de 100 mil pessoas a trabalhar com vínculos precários em funções públicas.

A Segurança Social, uma conquista histórica e social que deveria garantir a solidariedade entre gerações e assegurar o apoio a todos/as em situação de vulnerabilidade, exclui hoje um número crescente de trabalhadores/as. Os/as trabalhadores/as sujeitos/as à ilegalidade dos falsos recibos verdes, quase sempre com baixos salários, contribuem para a Segurança Social, mas quase sem contrapartidas.

É neste contexto que muitas vezes estes/as trabalhadores/as têm de escolher entre cumprir com as suas contribuições para a Segurança Social ou fazer face às dificuldades do quotidiano.

Assim, há hoje milhares de trabalhadores/as a recibos verdes que viram acumular-se uma dívida à Segurança Social, que, nas suas condições, não conseguem saldar. Uma dívida quase sempre contraída numa situação que, além de injusta, é ilegal. É uma dívida contraída porque os patrões não descontaram o que deveriam, se a esse trabalho correspondesse o contrato de trabalho devido; é uma dívida contraída por milhares de pessoas que nunca tiveram direito aos subsídios de férias ou de Natal; é uma dívida contraída por pessoas que, por serem cinicamente consideradas empresários/as, nunca tiveram apoio na doença ou no desemprego.

A Segurança Social é uma conquista que não queremos perder. Queremos defendê-la, para que ela seja uma garantia solidária que nos proteja nas dificuldades e nos dê segurança quando olhamos para o presente e o futuro. Sabemos que os sucessivos Governos a têm vindo a esvaziar e afirmamos que nos bateremos por ela e pelo seu aprofundamento, capacidade e dotação. Uma sociedade com direitos no trabalho e na vida não pode dispensar uma Segurança Social forte e universal.

É por isso que dizemos que, quando olhamos para as dívidas destes/as trabalhadores/as à Segurança Social, se têm de fazer contas. O Estado permitiu a instalação confortável do abuso e da ilegalidade nas relações laborais. Não pode agora executar cegamente estas dívidas.

Assim, porque queremos uma Segurança Social forte, a que corresponda uma sociedade com direitos no trabalho e na vida, e porque não aceitamos que seja a própria Segurança Social a tornar-se uma forma de chantagem para os/as trabalhadores/as, exigimos que as dívidas contraídas por estes/as trabalhadores/as não possam ser executadas sem que sejam averiguadas as condições nas quais elas foram contraídas. Fazer as contas tem de ser um momento esclarecedor e rigoroso: a dívida daqueles/as a quem são devidos direitos há anos, tem que ser equacionada mediante a avaliação da responsabilidade dos que lucraram com a sobre-exploração do seu trabalho.

Esta proposta é incontornável na medida em que identifica (e pretende resolver) uma perversão no modo como se usa e abusa da legislação que autoriza a existência dos recibos verdes, que tem vindo a ser utilizada por um número cada vez maior de entidades empregadoras. O Estado tem que falar e terminar com as ilegalidades e injustiças a que se têm de sujeitar cada vez mais pessoas, desde logo na Segurança Social. Por isso, afirmamos: antes da dívida, temos direitos!

APRE! – Activistas Precários
FERVE- Fartos/as d’Estes Recibos Verdes
Plataforma dos Intermitentes do Espectáculo e do Audiovisual
Precários Inflexíveis


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