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30/07/2009

Crise no Reino Unido: Em queda livre

Ao contrário de alguns prognósticos optimistas que já avistam o fim da crise, os dados provisórios do gabinete de Estatísticas do Reino Unido mostram um agravamento da situação.

O Produto Interno Bruto do Reino Unido contraiu-se duas vezes mais do que previsto no segundo trimestre em relação aos primeiros três meses do ano. Em comparação com o segundo trimestre de 2008, este indicador sofreu a mais forte descida de sempre (5,7%), isto é, desde 1955, ano em que se iniciou este registo estatístico.
Assim, a economia teve uma quebra de 0,8 por cento em relação ao primeiro trimestre, quando se esperava um recuo de apenas 0,3 por cento. A situação real do Reino Unido, a primeira das grandes economias europeias a divulgar resultados do segundo trimestre, mostra-se muito mais grave do que as previsões prometiam.
Se, até aqui, analistas e governantes anunciavam uma recuperação do PIB para níveis positivos já nesta segunda metade do ano, agora põem de lado essa hipótese e admitem que a recuperação poderá tardar.
Na verdade, o PIB britânico está em queda livre pelo quinto trimestre consecutivo, numa economia que entrou em recessão entre Junho e Setembro de 2008. Desde então, o país perdeu 5,8 por cento da sua riqueza.
No último trimestre os sectores mais atingidos foram o financeiro, com uma queda de 0,7 por cento, a produção industrial (-0.7%), e sobretudo a construção, que caiu 2,2 por cento entre Abril e Junho, acumulando uma quebra de 14,7 por cento nos últimos 12 meses. Os serviços perderam 0,6 por cento neste último período e 3,8 por cento em comparação com o mesmo trimestre do ano passado.

Desemprego recorde

Desde que começaram a ser elaboradas estatísticas sobre o número de desempregados no Reino Unido, em 1971, nunca se tinha observado um aumento tão drástico como o que foi revelada no passado dia 15.
Entre o início de Março e o fim de Maio últimos, 281 mil pessoas perderam o emprego, elevando a taxa para 7,6 por cento, ou seja, um agravamento de 2,4 pontos percentuais em comparação com o mesmo período de 2008.
Todavia, os números oficiais não traduzem a real gravidade da situação social. Se uma parte dos trabalhadores continua oficialmente empregada, as suas condições foram fortemente degradadas, já que as empresas deitaram mão a todos os mecanismos legais de «flexibilidade» laboral. Em muitos casos, só teoricamente o emprego se mantém uma vez que até o salário foi suspenso.
Para além da redução de salários e do tempo de trabalho, as empresas recorrem crescentemente às férias não remuneradas e já há casos em que pedem aos efectivos para trabalharem de borla.
No dia 13, os 3200 pilotos da British Airways aceitaram a redução de 2,6 por cento das suas remunerações em simultâneo com um aumento da carga horária. Em troca receberão acções da companhia e a promessa de que não haverá despedimentos em massa.
Aos restantes empregados, a transportadora propôs igualmente reduções salariais, «férias» sem remuneração e mesmo trabalho voluntário não remunerado. Cerca de sete mil trabalhadores aceitaram renunciar ao seu salário de férias e outros 800 predispuseram-se a trabalhar gratuitamente durante um mês.
Mais recentemente, a companhia propôs a possibilidade de férias até um ano, subsidiadas com 25 por cento do salário. Outra alternativa é passar a tempo parcial, opção que é incentivada com a atribuição de um prémio único de mil libras (1200 euros).

Subemprego generaliza-se

Com estes procedimentos, que permitem uma substancial redução dos custos de mão-de-obra, a administração calcula que poderá rever em baixa o anunciado plano de 15 mil despedimentos durante um ano.
Estas práticas não constituem propriamente uma novidade no Reino Unido. O trabalho parcial, as férias forçadas e outros mecanismos previstos na lei eram já amplamente utilizados no sector automóvel ou na construção. Porém, a crise económica generalizou-os à maioria das actividades incluindo os serviços.
A famosa empresa de consultadoria KPMG ou o grupo de imprensa Financial Times acabam de propor aos seus empregados que passem ao regime de tempo parcial. O próprio governo trabalhista veio dizer que a crise obrigará um milhão de trabalhadores a aceitar o tempo parcial.
Segundo um estudo publicado em Junho pela Confederação da Indústria Britânica, realizado junto de 700 empresas que empregam três milhões de pessoas, um terço dos patrões já recorreu aos mecanismos de flexibilidade laboral para reduzir custos salariais.
Embora mantendo o emprego, a redução ou suspensão dos salários deixa as famílias sem meios de sustento. Conscientes desta situação, a confederação patronal e os sindicatos pedem ao governo que atribua subsídios parciais de desemprego que garantam a sobrevivência destes trabalhadores.
Avante - 30.07.09

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