Na generalidade
No contexto do Acordo Tripartido para um Novo Sistema de Regulação das Relações Laborais, das Políticas de Emprego e da Protecção Social, celebrado em 2008, e que esteve na origem do Código do Trabalho revisto pela Lei 7/2009, de 12 de Fevereiro, a problemática da segurança e saúde no trabalho em abordada em duas vertentes:
1º A simplificação administrativa, preconizando-se nomeadamente a simplificação do processo de autorização dos serviços externos de segurança, higiene e saúde no trabalho e a possibilidade de cumprimento por meio informático de um conjunto de obrigações das entidades empregadoras neste domínio;
2º A sistematização da legislação laboral, no âmbito da qual se propõe que, no que toca aos regimes da segurança, higiene e saúde no trabalho e da reparação dos acidentes de trabalho e doenças profissionais, apenas as normas fundamentais continuem a constar do Código do Trabalho, remetendo-se a restante regulamentação para legislação avulsa.
No que toca à sistematização, o princípio consagrado no Acordo encontra-se já plasmado no novo Código do Trabalho, aprovado pela lei 7/2009, de 12 de Fevereiro, o qual inclui um capítulo dedicado à prevenção e reparação dos acidentes de trabalho, no qual se consagram os princípios fundamentais em matéria de segurança e saúde no trabalho (artigos 281º e 282º) e em matéria de reparação de acidentes de trabalho e doenças profissionais (artigo 283º).
Conforme a CGTP-IN observou em sede de apreciação pública da proposta de lei que deu origem ao novo Código do Trabalho, embora concordemos e sempre tenhamos defendido, tendo em conta as suas características e especificidades, a necessidade de autonomização do regime da reparação dos acidentes de trabalho e doenças profissionais, já quanto ao regime da segurança e saúde no trabalho temos sérias dúvidas relativamente à necessidade e eficácia da sua autonomização, pois estamos indubitavelmente perante regras directamente relacionadas com o trabalho e as condições em que é prestado e com os direitos e deveres dos sujeitos da relação laboral.
Por outro lado, discordamos da opção de incluir num mesmo capítulo, sob a designação de «Prevenção e reparação dos acidentes de trabalho e doenças profissionais», os princípios relativos à segurança e saúde no trabalho e à reparação dos acidentes de trabalho e doenças profissionais, entendendo que tal opção reflecte uma concepção retrógrada da prevenção dos riscos profissionais e da promoção da segurança e saúde no trabalho.
Efectivamente, esta opção configura uma desvalorização dos conceitos de prevenção dos riscos profissionais e de promoção da segurança e saúde no trabalho e reflecte uma visão meramente instrumental da prevenção, afastada pelo menos desde 1989, com a consagração, na Directiva quadro em matéria de segurança e saúde no trabalho, de uma filosofia geral de prevenção que preconiza a promoção da saúde e bem-estar dos trabalhadores a todos os níveis e que afasta a ideia de que as políticas de segurança e saúde no trabalho se esgotam no combate à sinistralidade laboral.
Neste contexto, afigura-se-nos pois como algo absurda esta pretensão de resumir a prevenção dos riscos profissionais e a promoção da segurança e saúde no trabalho à prevenção dos acidentes de trabalho e doenças profissionais, ignorando todo o edifício legislativo e doutrinário que tem vindo a ser sedimentado ao longo destes anos.
No que toca especificamente à Proposta em apreciação, verificamos que não foram introduzidas alterações substanciais ao regime jurídico actualmente vigente, que se mantém praticamente intocado nos seus aspectos essenciais. Não obstante, há aspectos no actual regime que carecem de facto de ser alterados, com especial destaque, entre outros, para o processo de eleição dos representantes dos trabalhadores para a segurança e saúde no trabalho que, tal como está previsto, tendo em conta a sua complexidade e carga burocrática implícita, constitui um verdadeiro obstáculo à eleição destes representantes. É de lamentar que não se tenha aproveitado esta oportunidade para simplificar e facilitar estes procedimentos, tornando-os mais adequados ao efectivo exercício dos direitos pelos trabalhadores.
A principal inovação desta Proposta é a introdução (na lei quer regulamenta especificamente a segurança e saúde no trabalho) de um capítulo dedicado à Protecção do património genético, no qual se inclui também, quanto a nós erradamente, o regime das actividades proibidas ou condicionadas às trabalhadoras grávidas, puérperas e lactantes e o regime das actividades proibidas ou condicionadas a menores.
Salvo melhor opinião, o regime especial de protecção da segurança e saúde das trabalhadoras grávidas, puérperas ou lactantes e o regime especial de protecção da segurança e saúde dos menores não tem nada a ver com a protecção do património genético; são regimes instituídos por razões inteiramente diferentes, sendo os primeiros estabelecidos em razão da especial vulnerabilidade daqueles grupos de trabalhadores face a determinados processos e condições de trabalho. A protecção do património genético, por seu lado, sendo também um regime especial, é potencialmente aplicável a todos os trabalhadores em idade fértil, desde que estejam expostos a riscos para o património genético. Assim, não faz qualquer sentido misturar num mesmo capítulo, designado de protecção do património genético, todos estes regimes, que na realidade só têm em comum o facto de serem regimes especiais no âmbito da protecção da segurança e saúde no trabalho.
Em nosso entender, estes três regimes especiais deviam corresponder a três capítulos autónomos, sistematicamente inseridos no final desta Proposta de Lei, depois de todas as disposições gerais relativas à matéria de segurança e saúde no trabalho, incluindo tudo o que respeita à organização dos serviços.
Outra área onde se registam alterações com algum significado é a organização dos serviços de segurança e saúde no trabalho, com a criação da figura do serviço comum e com uma pretensa agilização e desburocratização do processo de autorização das empresas prestadoras de serviços externos – porém, para além da separação dos processos de autorização para a área da segurança ou para a área da saúde, que se afigura mais um factor susceptível de tornar o processo ainda mais lento e complexo, não registamos melhorias substanciais. A única alteração que, de facto, parece susceptível de facilitar ou acelerar o processo é a introdução da figura da vistoria urgente mas, por outro lado, esta possibilidade é susceptível de pôr em causa a qualidade dos serviços na medida em que implica menor rigor na verificação dos requisitos básicos de funcionamento destas empresas, arriscando-se para mais a transformar-se no processo normal de autorização, já que a Proposta não prevê o seu carácter excepcional.
Na especialidade
PRINCÍPIOS GERAIS
- Artigo 5º – Princípios gerais
Consideramos imprescindível que a norma dedicada à enunciação dos princípios gerais relativos à prevenção dos riscos profissionais consagre expressamente, em termos claros e inequívocos, o dever de o empregador assegurar aos trabalhadores condições de segurança e saúde em todos os aspectos relacionados com o trabalho.
Em segundo lugar, é necessário clarificar a segunda parte do nº 1 do artigo 5º, nomeadamente referindo de modo expresso quais as situações em que existe uma entidade (que aparentemente não é a entidade empregadora) que gere as instalações em que a actividade é desenvolvida e é responsável pela segurança e saúde dos trabalhadores.
- Artigo 12º – Licenciamento e autorização de laboração
Seria útil a referência específica à legislação em causa ou pelo menos uma melhor identificação do tipo ou tipos de licenciamento e autorizações de laboração que estão em causa.
OBRIGAÇÕES GERAIS DO EMPREGADOR E DO TRABALHADOR
- Artigo 15º – Obrigações gerais do empregador
O nº1 deste artigo está incompleto – o empregador deve assegurar ao trabalhador condições de segurança e saúde em todos os aspectos do seu trabalho.
O nº2 enumera os princípios gerais de prevenção, sendo que alguns dos princípios que constam actualmente do elenco do nº2 do artigo 273º do Código do Trabalho aprovado pela Lei 99/2003, de 27 de Agosto, foram retirados desta lista principal e individualizados nos números seguintes do artigo em apreço, o que parece significar que deixaram de ser considerados como princípios gerais de prevenção. Sem prejuízo de considerarmos que efectivamente alguns dos itens incluídos na lista do nº2 do citado artigo 273º não correspondem a princípios gerais de prevenção, entendemos que pelo menos a avaliação dos riscos e a vigilância da saúde dos trabalhadores devem indiscutivelmente constar entre os princípios gerais de prevenção.
A disposição do nº 12 do artigo 15º corresponde a um princípio fundamental na área da prevenção dos riscos profissionais e da segurança e saúde no trabalho e, como tal, deve ser autonomizado em disposição própria, assumindo o relevo e destaque que merece na economia do diploma.
- Artigo 16º – Actividades simultâneas ou sucessivas no mesmo local de trabalho
Na alínea c) do nº 2 é necessário esclarecer a diferença entre trabalhadores por conta própria, independentes e ao abrigo de contrato de prestação de serviços, para os efeitos desta lei.
Por outro lado, o nº 3 deste artigo 16º atribui determinadas responsabilidades em matéria de segurança e saúde à empresa utilizadora ou adjudicatária da obra ou do serviço, mas não define de modo claro a extensão e alcance dessa responsabilidade, o que é essencial para que possa ser concretizada.
- Artigo 17º – Obrigações do trabalhador
Nos termos do nº4 deste artigo, o trabalhador que viole com negligência grave ou grosseira as obrigações a que está sujeito incorre em responsabilidade disciplinar e civil, o que pode implicar a obrigação de indemnizar eventuais prejuízos causados. Curiosamente, o empregador que viole ou não cumpra as obrigações em matéria de segurança e saúde no trabalho está apenas sujeito a coima, não havendo qualquer previsão de responsabilidade civil e correspondente obrigação de indemnizar eventuais prejuízos causados ao trabalhador.
- Artigo 18º – Consulta dos trabalhadores
A referência à alínea j) do nº1 não tem sentido.
- Artigo 19º – Informação dos trabalhadores
Nos termos do nº6 deste artigo, o empregador devia comunicar, não apenas a admissão de trabalhadores com contrato por tempo determinado, mas também a admissão de trabalhadores em regime de trabalho temporário, em comissão de serviço, em regime de cedência ocasional, em regime de trabalho intermitente e ainda a celebração de contratos de prestação de serviços que impliquem a permanência de trabalhadores nas instalações da empresa.
REPRESENTANTES DOS TRABALHADORES
- Artigo 20º – Representantes dos trabalhadores
Foi introduzida a possibilidade de o número de representantes dos trabalhadores para a segurança e saúde no trabalho ser alterado por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, de modo que a disposição legal que estabelece este número passou a ter carácter meramente supletivo.
A CGTP-IN discorda da possibilidade de o número de representantes legalmente estabelecido em função do número de trabalhadores da empresa poder ser reduzido por instrumento de regulamentação colectiva, entendendo que por esta via só deve ser possível estabelecer um número superior ao previsto na lei.
Em segundo lugar, entendemos que a lei tem que resolver a questão do número de representantes possíveis quando a empresa dispõe de grande número de estabelecimentos geograficamente dispersos; neste caso, deve ser fixado um critério que permita a existência de pelo menos um representante dos trabalhadores para a segurança e saúde no trabalho por cada conjunto de três estabelecimentos situados num raio de 100 quilómetros.
Por fim, a CGTP-IN entende que é necessário aumentar para pelo menos 8 horas mensais o crédito de horas concedido para o exercício das funções de representante dos trabalhadores para a segurança e saúde. Além deste crédito de horas, os representantes devem ainda dispor de dois dias por mês exclusivamente para formação em segurança e saúde.
- Artigo 21º – Formação dos representantes dos trabalhadores
No entender da CGTP-IN, a formação dos representantes dos trabalhadores para a segurança e saúde no trabalho nos termos do nº1 deste artigo deve ser preferencialmente assegurada pelas estruturas sindicais.
Em contrapartida a formação dos trabalhadores designados para o exercício de funções de segurança e saúde no trabalho ou para acompanhar a actividade de serviços externos deve ser da inteira responsabilidade do empregador, bem como a formação dos trabalhadores em geral na área da segurança e saúde.
Aliás, constatamos que foi eliminada a norma que prevê o direito dos trabalhadores à formação em segurança e saúde no trabalho, o que consideramos totalmente injustificado e inaceitável – a formação adequada do trabalhador em segurança e saúde no trabalho, tendo em conta o posto de trabalho e as actividades desenvolvidas, em particular tratando-se de actividade de risco elevado, é um elemento fundamental da prevenção dos riscos profissionais, que não pode ser omitido nem ignorado.
- Artigos 25º a 39º – Eleição dos representantes dos trabalhadores para a segurança e saúde no trabalho
Verificamos que a regulamentação do processo de eleição dos representantes dos trabalhadores para a segurança e saúde no trabalho não sofreu alterações relativamente ao actualmente regulado na Lei 35/2004, de 29 de Julho.
A CGTP-IN considera (como sempre considerou) que este processo se encontra regulamentado de forma demasiado exaustiva, não deixando espaço para a auto-organização dos trabalhadores e impondo limitações intoleráveis a todo o processo; por outro lado, introduz uma pesada carga burocrática, cujo único objectivo parece ser entravar e dificultar a realização de eleições, e possibilita uma inaceitável ingerência patronal no processo. Não é aceitável que este processo seja mais complexo e os trabalhadores tenham sobre ele menor domínio do que no caso do processo de eleição das comissões de trabalhadores.
Em nosso entender, é totalmente incompreensível que não se aproveite esta oportunidade para simplificar o processo de eleição dos representantes dos trabalhadores para a segurança e saúde no trabalho.
PROTECÇÃO DO PATRIMÓNIO GENÉTICO
Conforme já sublinhámos na parte introdutória, consideramos incorrecta a inclusão neste capítulo dos regimes especiais de segurança e saúde no trabalho das trabalhadoras grávidas, puérperas e lactantes e dos menores, uma vez que a especial protecção conferida a estes grupos não se relaciona com o risco para o património genético; por outro lado, a inclusão destes regimes neste capítulo é susceptível de induzir interpretações erradas, levando ao entendimento de que a protecção especial daqueles grupos de trabalhadores só existe ou só é necessária quando houver risco para o património genético.
- Artigo 40º – Riscos para o património genético
O nº 1 deste artigo inclui uma lista de agentes e factores susceptíveis de causar riscos para o património genético. Mesmo tratando-se de uma lista aberta, na medida em que é meramente exemplificativa, entendemos que é necessário incluir uma disposição que preveja a sua actualização em função dos progressos da ciência que permitam identificar novos factores de risco.
- Artigo 41º – Avaliação dos riscos susceptíveis de efeitos prejudiciais no património genético
A redacção do nº1 não faz sentido, está incompleta.
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- Artigo 44º – Resultados da vigilância da saúde
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Não está prevista a possibilidade de o resultado da vigilância da saúde revelar que o trabalhador foi de facto afectado pela exposição ao risco, designadamente no caso de ser detectada uma das afecções previstas no nº 3 do artigo 43º desta proposta.
Esta possibilidade deve ser expressamente prevista, determinando-se igualmente as obrigações e responsabilidades do empregador em tal situação.
- Artigo 47º – Actividades proibidas ou condicionadas
É necessário definir quais os factores de natureza psicossocial que podem causar os efeitos previstos, sendo de salientar que o artigo 40º (que define os riscos para o património genético), apenas define os agentes químicos, físicos e biológicos.
Por outro lado, apesar de esta disposição se referir simultaneamente a actividades proibidas e actividades condicionadas, não existe qualquer sequência de regulação no que respeita às actividades condicionadas, sendo que o artigo seguinte (48º) regula apenas a utilização de agentes proibidos.
- Para finalizar, salientamos que as regras de protecção do património genético actualmente em vigor (ver artigos 41º a 65º da Lei 35/2004, de 29 de Julho) nos parecem muito mais completas do que as consagradas nesta Proposta, o que se nos afigura incompreensível na medida em que pode significar uma redução do nível de protecção dos trabalhadores eventualmente expostos a riscos para o património genético.
- Artigos 49º a 59º – Actividades proibidas ou condicionadas a trabalhadoras grávidas, puérperas ou lactantes
De salientar que a referência às trabalhadoras puérperas desaparece da secção dedicada às actividades proibidas que, aliás, é titulada apenas de “Actividades proibidas a trabalhadora grávida e lactante” – significa isto que deixa de haver actividades proibidas à trabalhadora lactante e, portanto, que não há risco para a trabalhadora nesta situação?
No que toca às actividades condicionadas, nos termos do artigo 56º da Proposta, também deixam de existir condicionamentos à exposição das trabalhadoras puérperas ou lactantes a agentes físicos – considera-se que deixaram de existir riscos neste caso?
SERVIÇOS DE SEGURANÇA E SAÚDE NO TRABALHO
- Artigo 75º – Serviço Nacional de Saúde
Em primeiro lugar, é necessário determinar expressamente que a intervenção do Serviço Nacional de Saúde relativamente à vigilância da saúde nos termos previstos neste artigo não exonera as entidades empregadoras das responsabilidades que legalmente lhes cabem neste domínio.
Por outro lado, a disposição do nº3 deste artigo necessita ser clarificada, no sentido de saber quem, no caso de não existirem (ou enquanto não existirem) no Serviço Nacional de Saúde serviços adequadamente organizados ou serviços externos convencionados, assegura a vigilância da saúde dos trabalhadores aqui referidos.
- Artigo 80º – Dispensa de serviço interno
A lei deve determinar de forma expressa que esta dispensa só pode ser concedida no caso de empresas que não exerçam actividades de risco elevado. Em nosso entender, as empresas que exerçam qualquer actividade considerada de risco elevado devem sempre dispor de serviços internos de segurança e saúde no trabalho, independentemente do número de trabalhadores.
Na alínea a) do nº4, o período relevante para aferir das taxas de incidência de acidentes de trabalho deve ser um período consecutivo de dois anos após a concessão da dispensa, pois só um período posterior à concessão da autorização da dispensa será relevante para aferir das eventuais consequências desta opção sobre a taxa de acidentes de trabalhos verificados.
O nº5 do mesmo artigo 80º fixa um prazo para o organismo competente conceder a autorização de dispensa de serviços internos, mas não prevê as consequências do incumprimento do prazo, que consideramos inaceitável em matéria como esta.
- Artigo 82º – Autorização de serviço comum
O serviço comum é uma nova modalidade de organização dos serviços de segurança e saúde no trabalho criada nesta Proposta, cujos contornos se encontram insuficientemente definidos, nomeadamente no que toca à natureza jurídica que pode revestir este serviço comum – por exemplo, se o serviço comum for constituído sob a forma de empresa não entendemos como se estabelece a distinção com um serviço externo prestado através de uma empresa especializada em serviços de segurança e saúde no trabalho.
Constatamos também que a autorização para o serviço comum não está sujeita a quaisquer requisitos específicos, o que parece indicar que qualquer empresa (que não esteja legalmente obrigada a dispor de serviço interno) pode optar por esta modalidade; por outro lado, a entidade prestadora deste serviço comum também não está sujeita a quaisquer condições especiais em termos de recursos materiais, técnicos ou humanos, ao contrário do que sucede com as empresas prestadoras de serviços externos.
Ignoramos ainda qual a relação que se estabelece entre este serviço comum e as empresas que o constituem – se o serviço comum se destina a funcionar como uma espécie de serviço interno comum a várias empresas, então a lei deveria limitar a dimensão das empresas que podem recorrer a esta modalidade. Porém, se a ideia é que o serviço comum se constitua sob a forma de entidade prestadora de serviços a várias empresas, então a figura não se distingue verdadeiramente do serviço externo e a entidade prestadora deve estar sujeita aos mesmos requisitos de autorização e funcionamento aplicáveis às empresas prestadoras de serviços externos de segurança e saúde no trabalho, sob pena de concorrência desleal.
Finalmente, o nº6 do artigo 82º fixa um prazo para o organismo competente emitir autorização, mas mais uma vez não estão previstas as consequências para o incumprimento do prazo, o que é inaceitável.
- Artigo 84º – Autorização de serviços externos
A existência de dois processos totalmente autónomos, um para o exercício de actividade na área da segurança junto do organismo competente do ministério responsável pela área laboral e outro para exercício de actividade na área da saúde junto do organismo competente do ministério responsável pela área da saúde, afigura-se-nos mais uma complicação do que uma medida simplificadora, não estando bem esclarecido se os requerentes que pretendem exercer actividade em ambas as áreas terão que organizar e apresentar dois processos autónomos.
Por outro lado, o facto de uma autorização poder ser concedida antes da outra, pode levar facilmente à tentação de iniciar também a actividade na outra área, ainda não autorizada, o que é de todo indesejável.
- Artigo 85º – Requisitos da autorização
A referência constante da alínea e) do nº 1 para o nº1 do artigo 76º não faz sentido, porque esta disposição não prevê quaisquer actividades.
- Artigo 86º – Pedido de autorização
Sem prejuízo do que afirmámos acima acerca da existência de dois processos, este artigo devia esclarecer se o requerimento, com todos os documentos aqui referidos, deve ser enviado em duplicado às duas entidades competentes, no caso de se pretender exercer actividade simultaneamente nas áreas da segurança e da saúde – o nº 5 deste artigo não é muito claro a este respeito, mas parece querer indicar que basta enviar o processo para uma das entidades, que ficará obrigada a remeter o processo também para a outra, se for o caso. Este aspecto deverá ficar previsto de modo expresso e muito claro.
- Artigo 89º – Vistoria urgente
As vistorias são um elemento fundamental do processo de autorização, devendo por isso ser especialmente rigorosas e decisivas para a concessão da autorização.
Assim, e sem prejuízo de considerarmos que a criação da figura da vistoria urgente pode ter alguma utilidade, entendemos que este procedimento não pode significar menor rigor na verificação e avaliação dos requisitos e condições necessários à concessão da autorização.
Neste sentido a lei deve definir de modo muito claro e expresso quais os requisitos que não estão sujeitos a vistoria nos termos do nº1 deste artigo e quais os que se consideram susceptíveis de apreciação meramente documental nos termos da alínea a) do nº2.
O recurso à vistoria urgente não pode em caso algum servir de pretexto para um maior facilitismo na concessão de autorizações nem pode tornar-se no método normal de concessão de autorização. A lei deve ter prever o seu carácter excepcional devidamente justificado.
- Artigo 93º Decisão
Nos termos do nº4, a autorização para o exercício da actividade de segurança e saúde no trabalho na modalidade de serviços externos deve ser decidida no prazo de 90 dias, mas mais uma vez não se fixam as consequências para o incumprimento do prazo.
- Artigo 95º – Auditoria
As auditorias para controlo da qualidade dos serviços prestados pelas empresas de segurança e saúde no trabalho autorizadas são extremamente importantes.
Neste sentido, a CGTP-IN entende que a lei devia estabelecer mecanismos de auditoria e vistoria periódicas e de acompanhamento da actividade através do cumprimento de algumas formalidades de controlo.
Um dos aspectos fundamentais que é necessário monitorizar, para além obviamente da manutenção dos requisitos e condições de funcionamento exigíveis, é verificar se as empresas autorizadas prestam efectivamente todos os serviços contratados em relação às empresas suas clientes e se os serviços contratados e prestados correspondem ao elenco de actividades obrigatórias por lei para os serviços de segurança e saúde.
FUNCIONAMENTO DOS SERVIÇOS
- Artigo 98º – Actividades principais
No entender da CGTP-IN, clarificar e sistematizar o núcleo essencial das actividades de segurança e saúde no trabalho é positivo e necessário, mas isto não significa que concordemos em absoluto com o dispositivo escolhido.
Em primeiro lugar, consideramos que as actividades da área dos serviços de segurança deviam ser separadas das da área dos serviços de saúde, já que neste último domínio se verifica a necessidade de impor requisitos de confidencialidade e limitações de acesso à informação que não se verificam naquela. Assim, por exemplo, consideramos que as responsabilidades cometidas genérica e indiscriminadamente aos serviços de segurança e saúde no trabalho pelas alíneas m) e n) no que toca à realização de exames de saúde, à organização de registos clínicos e elaboração de fichas de saúde, sem determinar expressamente que estas tarefas são da exclusiva competência dos serviços de saúde e dos médicos e profissionais responsáveis obrigados a sigilo profissional, corresponde à abertura de um grave precedente na área do dados sensíveis, que contraria a jurisprudência do Tribunal Constitucional.
Por outro lado, é necessário determinar inequivocamente que todas estas actividades são obrigatórias, qualquer que seja a modalidade de organização de serviços escolhida.
- Artigo 102º – Informação técnica
A lei deve definir claramente quem pode ter acesso à informação técnica relativa à segurança no trabalho, devendo em qualquer caso esta informação ser sempre acessível aos representantes dos trabalhadores para a segurança e saúde no trabalho, ainda que sob reserva de confidencialidade nos termos gerais aplicáveis às informações transmitidas às estruturas representativas dos trabalhadores.
A CGTP-IN considera inaceitáveis os termos em que está definido, no nº3 deste artigo, o acesso à informação sobre segurança no trabalho por parte dos representantes dos trabalhadores.
- Artigo 106º Acesso a informação
Para além do acesso a informação por parte do médico, é essencial que sejam previstos mecanismos de articulação entre os médicos do trabalho e os técnicos de segurança, porque o que se verifica na prática é que os médicos frequentemente desconhecem completamente os riscos a que os trabalhadores estão concretamente expostos e as actividades de segurança desenvolvidas e respectivos efeitos na saúde dos trabalhadores. Este problema agudiza-se quando os serviços de segurança e os de saúde são prestados por entidades separadas e em particular quando se trata de serviços externos.
- Artigo 108º – Exames de saúde
Tendo em conta que todos os dados relativos à saúde das pessoas são tidos como dados especialmente sensíveis e sujeitos a regras estritas de protecção nos termos da Constituição e da Lei; tendo em conta também o disposto no Código do Trabalho, aprovado pela Lei 7/2009, de 12 de Fevereiro, em matéria de direitos de personalidade, especialmente os artigos 17º e 19º; e considerando finalmente os múltiplos e recorrentes abusos perpetrados neste domínio, entendemos que é oportuno que a regulamentação relativa à segurança e saúde no trabalho defina claramente quais os concretos exames de saúde cuja realização é exigível para estes efeitos.
Nomeadamente, a lei deverá prever que os exames de admissão e os exames periódicos que os trabalhadores estão obrigados a realizar compreendem apenas os exames e testes de saúde clinicamente adequados a comprovar a aptidão do trabalhador para o desempenho da sua actividade laboral e a determinar as repercussões da actividade desenvolvida na actividade do trabalhador. A decisão sobre o tipo de exames e testes de saúde a realizar é uma decisão exclusivamente clínica, que compete unicamente ao médico do trabalho, estando vedado ao empregador ou a quem o represente impor a realização deste ou daquele exame ou teste de saúde em concreto.
Lisboa, 6 de Maio de 2009
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