À procura de textos e pretextos, e dos seus contextos.

18/01/2010

Salários dos jovens estão a cair

Média salarial de 1,1 milhões de trabalhadores entre os 25 e os 34 anos recuou 2,8%, mais do que a inflação.

Os salários dos jovens estão a cair mais do que a inflação. Enquanto a generalidade dos indicadores aponta para ganhos globais de poder de compra extraordinários - a meio da maior recessão em décadas -, os dados mais recentes do Instituto Nacional de Estatística (INE) revelam que os trabalhadores por conta de outrem que têm entre 25 e 34 anos sofreram uma quebra nominal dos salários de 2,8%.

Até Setembro, a inflação média anual foi de -0,3%, pelo que estes trabalhadores perderam poder de compra. Os dados solicitados pelo DN, que são apurados pelo INE no âmbito do Inquérito ao Emprego, referem-se ao rendimento médio mensal líquido.

Em causa neste grupo etário estão 1,1 milhões de pessoas, que no terceiro trimestre de 2009 recebiam, em média, 706 euros por mês, contra os 726 euros apurados um ano antes. A série solicitada revela ainda que na última década só se registaram outros dois momentos de queda homóloga: em 2003, ano de recessão, e no final 2007, depois de um período de desemprego historicamente elevado (ver gráfico).

"Deixou de haver progressão salarial", refere Marcelino Pena Costa, presidente da Associação Portuguesa das Empresas do Sector Privado de Emprego. "Os licenciados entravam geralmente a ganhar 800 euros, mas depois de uns meses passavam a receber 1000 ou 1200 euros. Agora já não vejo abertura para ir subindo os salários", refere o responsável da APESPE, que representa empresas de recrutamento e de trabalho temporário.

Nos outros grupos etários a evolução dos salários foi positiva. Entre os trabalhadores dos 15 aos 24 anos (357 mil trabalhadores por conta de outrem) o aumento foi de 1,9%, enquanto no grupo dos que têm entre 35 e 44 anos (1,07 milhões) a variação foi de 2,3%. Os dados do INE apontam, por isso, para um aumento nominal global de 1,9%, num ano em que se perderam 104 mil empregos por conta de outrem, com particular incidência nos mais jovens.

Também as remunerações declaradas à Segurança Social, os aumentos por negociação colectiva ou os inquéritos do Ministério do Trabalho sugerem que em 2009 se registaram, em média, significativos ganhos nominais e reais nos ordenados.

São conclusões estatísticas que têm mais do que uma leitura. Anabela Carneiro, professora na Faculdade de Economia da Universidade do Porto, salienta que a destruição de empregos mal pagos pode enviesar análises baseadas na média salarial. "Está bem documentado na literatura que em períodos de recessão as empresas tenderão a reter os trabalhadores mais qualificados e a despedir os menos qualificados. Este efeito da alteração da composição da força de trabalho gerará, por si só, a ilusão de um comportamento contracíclico nos salários", refere a investigadora, co-autora de um estudo que conclui que existe uma relação directa entre o aumento do desemprego e a queda real dos vencimentos.

Por cada subida de um ponto percentual na taxa de desemprego, os salários dos novos contratados (do sexo masculino) caem 2,8% em termos reais, enquanto os dos que permanecem empregados recuam 1,4%, conclui o estudo publicado pelo Banco de Portugal.

"Aqueles que mantiveram o emprego tiveram o poder de compra aumentado", refere José Reis, da Universidade de Coimbra, lembrando que os elevados aumentos da função pública (2,9%) influenciam as empresas. O economista reconhece, contudo, grupos mais vulneráveis. "Os que têm de procurar emprego estão numa posição defensiva, compreendem que a sua vulnerabilidade aumentou. Há grupos fragilizados, e um deles é o dos jovens", afirma.

O economista apela à responsabilidade, salientando que dos salários depende a recuperação da procura. "Somos obrigados a criar espaço para lógicas menos egoístas sobre a crise em que estamos. Se não vier aí uma retoma florescente e luminosa - como se calhar não vem -, vamos ter todos de ganhar mais juízo."

http://dn.sapo.pt/bolsa/emprego/interior.aspx?content_id=1472496

Sem comentários:

Related Posts with Thumbnails