Eugénio Rosa
Apesar da crise grave que enfrenta o País e das dificuldades da maioria dos portugueses, só nos primeiros 9 meses de 2009 os cinco maiores bancos a funcionar em Portugal – CGD, BCPMillennium, Santander Totta, BES e BPI – obtiveram lucros líquidos que atingiram 1447,9 milhões de euros.
Para a banca parece que não há crise, ou melhor, a banca enriquece com a crise e com as dificuldades dos portugueses. Para além das formas clássicas de extracção de mais valia (taxas de juro e spreads elevados; comissões exorbitantes; especulação que de novo surge com força, etc.) que utiliza para obter elevados lucros, a banca também lança mão de duas outras formas importantes, menos conhecidas, que se vão analisar neste estudo.
No período 2005-2009, a banca arrecadou cerca de 1468 milhões de euros de lucros apenas por não ter pago a taxa legal de IRC e de derrama.
O Quadro I, construído com dados da Associações Portuguesa de Bancos, revela que a taxa efectiva de imposto paga pela banca tem sido sempre muito inferior à taxa legal.
Até 2007, a taxa legal de imposto que a banca devia pagar era 27,5% (25% de IRC + 2,5% de derrama). A partir de 2007 a taxa de impostos baixou fixando-se em 26,5% (25% de IRC + 1,5% derrama. No entanto, a banca nunca pagou essa taxa. Em 2005, de acordo com dados divulgados pela Associação Portuguesa de Bancos, a taxa média efectiva paga pela banca foi apenas de 11,7%. Em 2006, como consequência de uma forte denúncia feita na Assembleia da República, aquando do debate do Orçamento do Estado de 2006 em Dezembro de 2005, em que também participámos directamente, a taxa subiu para 19,4%. Mas foi «sol de curta duração» apesar das declarações solenes, tanto de Sócrates como do seu ministro das Finanças, de que a situação iria mudar, pois a taxa efectiva de imposto paga pela banca baixou para 14,5% em 2007. Em 2008, tornou a descer para apenas 12,8%, e a previsão para 2009 é que ela continue a descer, pois os dados divulgados pela Associação Portuguesa de Bancos revelam que, relativamente aos lucros líquidos do 1.º semestre deste ano, a banca prevê pagar uma taxa efectiva de imposto de apenas 9,9%.
Para se poder ficar com uma ideia das receitas perdidas pelo Estado e do ganho fácil que isso tem representado para os accionistas dos bancos basta dizer que, se no período 2005-1.º Semestre de 2009 a taxa efectiva de imposto paga pela banca coincidisse com a taxa legal (27,5% até 2007; e 26,5% depois de 2007), o Estado teria arrecadado mais 1468 milhões de euros de receitas que podiam ter sido utilizadas no apoio aos desempregados e no combate à pobreza mas que, no entanto, foram engrossar os elevados lucros da banca e, consequentemente, aumentar ainda mais os dividendos distribuídos todos os anos pela banca aos accionistas.
O Governo, quando é confrontado, para ocultar este escândalo apresenta taxas de impostos pagas pela banca superiores às que resultam dos dados divulgados pela Associação Portuguesa de Bancos. No entanto, nunca explica como chega a esses valores. A habilidade, para não dizer mesmo a manipulação feita pelo Governo está no facto de que reduz os lucros, deduzindo os benefícios fiscais que a banca tem, assim como os prejuízos, que a banca não tem, mas que vai buscar às empresas do grupo que controla para assim reduzir os lucros sujeitos a impostos.
Desta forma reduz os lucros, ou seja, a base de cálculo de imposto, aumentando assim, ficticiamente, a taxa que obtém. No entanto para a banca, e também para a Associação Portuguesa de Bancos (a prova são os dados que divulga), esses lucros que o Governo não considera ficam nos bancos e são distribuídos aos accionistas.
Banca arrecada 1002 milhões de euros de lucros à custa do pessoal
Os trabalhadores bancários começaram a negociar o seu Contrato Colectivo de Trabalho visando actualizar as remunerações. E os banqueiros, com a desfaçatez que os caracterizam, apresentaram uma proposta de aumento das remuneração de apenas 0,5%, um valor que é cerca de três vezes inferior à inflação que se prevê para 2010. Num momento destes, interessa recordar o aumento de lucros conseguido pela banca através da redução da percentagem que as Despesas com Pessoal representam do «Produto Bancário». O Quadro II, construído também com dados da Associação Portuguesa de Bancos, mostra o que tem acontecido desde 2005.
Em 2005, as Despesas com Pessoal correspondiam a 32% do Produto Bancário. A partir dessa data esta percentagem tem diminuído de uma forma contínua atingindo, em 2008, apenas 27,5%, tendo subido para 28,6% do Produto Bancário no 1.º semestre de 2009, mas não é certo que o ano termine com esta percentagem. Para se ficar com uma ideia da dimensão do ganho para banca, que foi engrossar os dividendos distribuídos aos accionistas, basta dizer o seguinte: Se banca tivesse mantido invariável, no período 2005-1.º Semestre de 2009, a percentagem que as despesas com pessoal representavam em relação ao Produto bancário em 2005, os trabalhadores poderiam ter recebido mais 1002 milhões de euros de remunerações. Como isso não sucedeu, os trabalhadores perderam, mas os administradores e os accionistas da banca ganharam também essa importância.
Remuneração média dos administradores variou entre 698 mil € e 777,1 mil € em 2008
O ano de 2008 foi um ano grave para todo o sistema financeiro devido a uma gestão irresponsável que atingiu, em muitos casos, ilegalidades, roubos, fraudes, etc., como sucedeu também em Portugal. No entanto, para os administradores dessa mesma banca em crise não houve crise que atingisse as suas remunerações. O Quadro III, construído com dados constantes de um relatório elaborado pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliário (CMVM) sobre o governo das sociedades cotadas na bolsa, mostra que, mesmo num ano de crise, os administradores receberam remunerações escandalosas, como se nada tivesse acontecido.
Em 2008, segundo o «Relatório anual sobre o governo das sociedades cotadas em Portugal», divulgado pela CMVM em 2009, a remuneração média anual de cada administrador do sector financeiro foi de 698 081,3 euros, atingindo 777 120,4 euros se o banco integrasse o PSI 20 (BCP, BES, e BPI).
É evidente que para os administradores da banca não houve crise.
http://www.avante.pt/noticia.asp?id=32133&area=19
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