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07/02/2009

Ricos temem fim dos seus privilégios

Cada vez mais suíços se incomodam com os privilégios fiscais dados aos super-ricos que se instalam na Suíça.

No domingo (08.02.09) os eleitores do cantão de Zurique votam no plebiscito que irá decidir se esses incentivos devem continuar a existir.

Michael Schumacher pode continuar a dormir tranqüilo. Já Theo Müller, bilionário que construiu um império industrial de laticínios na Alemanha e depois se refugiou na Suíça para não pagar os impostos de herança, tem motivos para se preocupar. Enquanto um vive às margens do lago de Genebra, o segundo está na chamada "Costa Dourada" do lago de Zurique.

Graças a uma exceção legal, os dois super-ricos estrangeiros praticamente não pagam impostos, pelo menos em relação às suas fortunas e rendas. Porém questiona-se agora se Müller continuará gozando do privilégio de viver em um paraíso fiscal: um número crescente de suíços começa a se incomodar com essa situação. No cantão de Zurique um plebiscito será realizado no domingo (oito de fevereiro) para deixar os eleitores decidirem se o sistema de acordo fiscal deva continuar a existir. A negativa nas urnas poderá servir de sinal para todos os outros cantões que oferecem esse tipo de privilégio para abonados.

A crítica não vêm só dos simples contribuintes. "Isso é uma vergonha sem fim, um escândalo", critica o também bilionário Philippe Gaydoul, chefe de uma grande rede de supermercados, a um jornalista ao ser questionado sobre o tema. Ele próprio não tem direito de se beneficiar do sistema porque é suíço. Apenas estrangeiros que não exercem nenhuma atividade - pelo menos oficialmente - podem fazer acordos especiais com as autoridades fiscais.

Cálculo do imposto


No acordo fiscal, o cálculo do imposto pago não é baseado na renda dos ricaços, mas sim no custo que este tem para viver na Suíça. Como trata-se de um valor difícil de calcular, geralmente as autoridades fiscais determinam um valor global que é, em geral, cinco vezes o aluguel pago pelo domicílio na Suíça. Por exemplo, quem tem uma mansão com um valor de aluguel mensal de 20 mil euros é tarifado como se sua renda fosse de 100 mil euros por mês, mesmo se ela é dez vezes maior. Dessa forma a pessoa paga 37 mil euros de imposto por mês.

Philippe Gaydoul, cuja fortuna é calculada em um bilhão de euros, desconta um valor certamente superior. "Como contribuinte suíço sinto-me lesado quando vejo como esses estrangeiros são beneficiados. Eles devem pagar o mesmo que nós", reclama o empresário.

Na Suíça cada cantão tem sua própria lei de impostos, mas todos os diferentes sistemas contêm regras especiais para estrangeiros abonados. Também o governo federal, que recolhe de todos os contribuintes suíços uma parte dos impostos, não se incomoda com Schumacher ou outras celebridades.

O fato é que o privilégio atrai cada vez mais milionários e bilionários à Suíça. Há dez anos eles eram aproximadamente 3.100. Hoje o país tem Michael Schumacher, a estrela francesa de rock Johnny Hallyday, o oligarca russo Viktor Wekselberg, a cantora Tina Turner ou os pilotos de Fórmula 1 Lewis Hamilton, Felipe Massa, Kimi Räikkönen e Heikki Kovalainen, além de muitos outros com o endereço fiscal estabelecido no país. Em 2006, o número de beneficiados pelos impostos ajustados já era de 4.150, a maioria estabelecida às margens do lago de Genebra. O cantão de Zurique tem 137 deles.

Iniciativa da esquerda


Para o partido de esquerda Lista Alternativa de Zurique, que iniciou o plebiscito, o privilégio fiscal dado aos ricos atenta contra o princípio geral de que impostos devam ser medidos segundo a capacidade econômica do contribuinte. Isso está previsto também na Constituição helvética.

Social-democratas, verdes e outros dois partidos também são da mesma opinião. Apesar das iniciativas anteriores terem sido derrotadas nas urnas para os opositores dos privilégios fiscais, hoje muitos conservadores estão mudando de opinião. Uma política do Partido Liberal (FDP, na sigla em alemão) originária de Küssnacht, comuna nobre às margens do lago de Zurique, explica a questão ao jornal alemão "Süddeutsche Zeitung": "Esses contribuintes beneficiados ocupam geralmente luxuriosas mansões na nossa região. Se um contribuinte normal morasse nelas, estaria pagando muito mais impostos à nossa comuna". O problema é ressaltado pelo fato dos abonados estrangeiros estarem inflacionando os preços dos imóveis, dos quais muitos já são inacessíveis aos próprios ricos suíços.

Em todo caso, os partidos conservadores pedem ao eleitor para não acabar com o acordos fiscais. Eles lembram que países como Grã-Bretanha, Bélgica e Luxemburgo também têm sistemas semelhantes. Os austríacos seriam até mais generosos que a Suíça já que seu residente milionário estrangeiro não necessita pagar mais impostos do que pagava na última residência. Assim, com uma passagem por Mônaco, o jet set consegue baixar ainda mais o seu nível fiscal.

Os conservadores suíços lutam pelo sistema por uma questão tática. Eles poderiam sacrificá-lo se os partidos de esquerda apoiarem uma redução geral do imposto de renda. Razão: os acordos fiscais com os milionários e bilionários não fazem chover dinheiro nos cofres públicos: em média, essas pessoas pagam apenas 64 mil euros de imposto por mês.
swissinfo, Alexander Thoele (com agências) - 07.02.09

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