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21/11/2009

Reacções à escolha do presidente da UE e da chefe da diplomacia: Surpresa, perplexidade e desilusão em toda a Europa

Teresa de Sousa

Consternação, perplexidade, desilusão, choque. Os títulos da imprensa europeia rivalizam entre si na busca das palavras mais fortes e exactas para descrever a escolha dos líderes europeus.
Quinta-feira à noite, em Bruxelas, num jantar que se previu prolongado e que acabou por ser um dos mais rápidos da história dos Conselhos Europeus, os chefes de Estado e de Governo da União Europeia tomaram uma decisão que aparentemente apenas agradou a eles próprios.

Cáustico, o "Financial Times" imagina uma frenética corrida à Wikipedia em todas as chancelarias mundiais para saber quem são o novo presidente da União Europeia, Herman Van Rompuy, e a nova chefe da diplomacia europeia, Catherine Ashton. "Dois desconhecidos", "duas figuras apagadas". "A UE encontrou dirigentes sem brilho, sem visão e, também, sem a experiências necessária", escreveu o alemão "Frankfurter Rundschau".

A revista "Der Spiegel" candidata-se ao título mais brutal: "A Europa elege zés-ninguéns". O "Independent" de Londres, ao mais irónico: "Equipa de sonho põe a Europa a dormir". O "El País", mais sóbrio, limita-se a destacar o contraste: "Nomes fracos para grandes desafios". O "Financial Times" consegue, porventura, a síntese mais política: "Ganhou a supremacia dos Estados". Alguns políticos reconhecidamente europeus ainda foram mais contundentes. "A Europa bateu no fundo", declarou o líder dos Verdes europeus, Daniel Cohen-Bendit. "Acabou a Europa política", acrescentou o socialista francês Michel Rocard.

Há um mundo de distância entre esta vaga de reacções negativas e a auto-satisfação exibida na véspera pelos líderes europeus. Entre eles, não se ouviu uma só voz discordante. Durão Barroso, o presidente da Comissão, foi o mais exultante: "Não poderia haver melhores escolhas do que estas duas personalidades". Angela Merkel, a chanceler alemã, fez o elogio do consenso "como o verdadeiro motor" da integração europeia. "Tenho plena confiança de que não dirão disparates", atribui-lhe o Monde. "Uma decisão sábia", acrescentou o seu homólogo francês, Nicolas Sarkozy. Para acrescentar: "[O presidente] vem de um país importante, embora não um dos mais importantes, de maneira a que ninguém se sinta excluído". Gordon Brown, o primeiro-ministro britânico e patrocinador da baronesa Ashton, congratulou-se com o facto de o seu país "continuar, desta forma, no coração da União Europeia."

Porquê estas escolhas?

Há duas conclusões que atravessam quase todas as análises da imprensa europeia. A primeira é que a escolha de duas figuras apagadas e quase desconhecidas pode matar o élan gerado pela aprovação do Tratado de Lisboa. A outra pode resumir-se assim: se a UE pretendia guindar-se à altura dos outros grandes actores mundiais, este não é o melhor caminho.

"Vai ser difícil explicar às pessoas por que é que havia tanta expectativa em relação ao Tratado de Lisboa, se tudo o que conseguimos foi nomear alguém de que ninguém ouviu falar", disse à Reuters um diplomata europeu. "Podem estas duas figuras encarnar o novo élan que nos foi prometido pelos nossos governantes?", pergunta o "Frankfurter Allgemeine Zeitung". E o "Guardian" remata em editorial: "Esta escolha reduz a nada a esperança da Europa de obrigar o mundo a prestar-lhe uma nova atenção. O Velho Continente afastou-se da mesa dos grandes, falhando a real oportunidade de se manter ao nível de um G2 dominado pelos pólos gémeos de Washington e de Pequim".

Porquê, então, estas escolhas - é a pergunta seguinte. Dominique Moisi, académico francês, diz que a UE "fez uma escolha baseada nas prioridades domésticas". "Não escolheram com base no mérito, não tomaram uma decisão verdadeiramente europeia, decidiram em função dos interesses britânicos, alemães e franceses".

O centrista francês François Bayrou considera que "o primeiro-ministro belga foi escolhido para não fazer sombra a ninguém". Passam também por aqui muitas das explicações para a decisão. "Os grandes Estados continuam no comando", analisa a Reuters. "Os chefes de Estado e de Governo europeus estão sobretudo preocupados com a sua própria presença nos palcos mundiais", acrescenta o "Financial Times Deutschland".

"É a vitória dos sindicatos", diz uma fonte diplomática em Lisboa. "Do sindicato dos chefes da diplomacia, que não querem tutelas. Dos chefes de Governo, que não querem sombra. Dos burocratas, que não querem perder o controlo." "Vai levar mais tempo a retirar todo o potencial do tratado."

Reacções mundiais

Ontem, Hillary Clinton declarou-se ansiosa por trabalhar com Van Rompuy e Ashton "para fortalecer e ampliar" a relação transatlântica. Mas não se esqueceu de enumerar a lista de assuntos que levará provavelmente para o primeiro encontro: Afeganistão, Irão, Médio Oriente. Os americanos falam de coisas concretas. Em Pequim, tomou-se nota "de mais um passo na integração europeia".

Em todo o mundo, "políticos e analistas vão tentar discernir qualquer coisa destas nomeações", escreve Richard Whitman da Chatham House de Londres. "Há muito pouco nas nomeações que leve alguém em Washington ou Pequim a acreditar que devem tomar a Europa mais a sério".

Caso encerrado? O "Monde" pede que "não se julgue depressa de mais". "Rampuy é um europeu convicto (...) e pode sempre contar-se com a capacidade de nos surpreender de uma trabalhista britânica aristocrática".
Público.pt - 21.11.09

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