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10/11/2009

Bancos apoiados pela Administração Obama deverão distribuir 30 mil milhões em bónus

Rosa Soares, José Manuel Rocha

Um ano depois de o sistema financeiro ter estado prestes a ruir e de a Administração norte-americana ter sido obrigada a segurar vários bancos de investimento, através de dinheiros públicos, o insólito está a acontecer: muitos dos bancos apoiados estão a apresentar lucros recordes e preparam-se para distribuir prémios igualmente recordes.

De acordo com as previsões de um conjunto de analistas contactados pela agência Bloomberg, os três maiores bancos de investimento norte-americanos, apoiados pelo programa de salvação financeira Troubled Asset Relief Program, deverão distribuir este ano 29,7 mil milhões de dólares, cerca de 19,79 mil milhões de euros.

Este montante, a confirmar-se, representará um crescimento de 60 por cento face ao montante distribuído no ano passado, já em plena crise financeira mundial, mas ficará também acima do valor distribuído em 2007, e que correspondia ao anterior recorde, no montante de 26,8 mil milhões de dólares.

Segundo a notícia da agência Bloomberg, o montante de prémios serão distribuídos por 119 mil colaboradores, o que corresponderá a 250,4 mil dólares a cada um, o que equivale a cinco vezes mais do que os 50,3 mil dólares de rendimento médio das famílias norte-americanas no ano passado.

Salários também sobem

As previsões dos analistas contactados pela Bloomberg surgem poucos dias depois deThe Wall Street Journal (WSJ) ter noticiado que, segundo contas feitas pelos seus peritos, as 23 instituições que lideram o sistema financeiro norte-americano vão pagar, este ano, 140 mil milhões de dólares aos seus funcionários em salários e demais compensações.

Este montante, que equivale a 94 mil milhões de euros, sensivelmente, a totalidade da riqueza criada em Portugal nos três primeiros trimestres deste ano, também representará um montante recorde.

Mais de um terço dos profissionais de Wall Street esperam um aumento dos prémios no corrente ano, revela um estudo realizado pela eFinancialCareers.com, junto de 1074 profissionais, citado também pela Bloomberg. O regresso à distribuição de elevados montantes em prémios tem gerado forte polémica nos Estados Unidos e na Europa, em parte por estar a ocorrer depois das elevadas ajudas públicas e porque, segundo muitos especialistas, boa parte da crise financeira mundial ficou a dever-se à política de prémios, que levou ao desenvolvimento de produtos e estratégias de alto risco, com a única preocupação de aumentar os lucros e a respectiva remuneração variável.Rastilho para a crise

"As compensações financeiras tiveram um papel fundamental na crise financeira, mas, entretanto, nada mudou", afirmou Robert Brown, professor de Direito na Universidade de Denver e especialista em governação corporativa, citado pelo WSJ.

Os líderes mundiais, em particular os do G-20, assumiram o objectivo de impor novas regras para a regulação dos mercados financeiros, incluindo a política de prémios, mas os progressos obtidos são, neste momento, muito pouco visíveis. Nos Estados Unidos, por exemplo, aguarda-se que o perito que Obama nomeou para impor regras nos bónus às instituições que receberam verbas do Estado apresente as suas propostas.

A pressão da opinião pública e da Reserva Federal norte-americana, liderada por Ben Bernanke, que diz que vai estar atenta à remuneração dos bancos apoiados, está apenas a gerar uma alteração nos procedimentos de atribuição dos prémios, que estão a assumir a mais a forma de entrega de acções, em detrimento de dinheiro, estratégia que, segundo a Boomberg, está a ser seguida pelo Morgan Stanley. Outros bancos, como o JP Morgan, estão a optar pelo aumento dos salários base dos colaboradores.

Na Europa o assunto também é polémico. O Reino Unido já impôs limites aos prémios de 16 entidades financeiras, nacionais e estrangeira, medida que será aplicada já em 2009. Mas também o presidente do Banco Central Europeu, Jean-Claude Trichet, deixou há poucos dias um aviso aos bancos: em vez de andarem a distribuir prémios, os bancos "devem ser prudentes e usar esse dinheiro para fortalecer os seus balanços".
Público.pt - 10.11.09

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