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28/09/2010

Revolver o lixo em busca de comida

foto Carlos Jorge Monteiro/Global Imagens
Revolver o lixo em busca de comida

 
Passam poucos minutos das 20 horas quando os funcionários de um supermercado, na Baixa de Coimbra, põem na rua caixotes do lixo com sobras de comida. Ainda não viraram costas e já há pessoas a revolvê-los para matar a fome. De dia, à vista de quem passa.  "Não tenho trabalho", diz ao JN, em tom de justificação, um jovem romeno, de 23 anos, com três filhos. Bananas, maçãs, fiambre, por vezes frango, eis o que leva dali.
Como ele, há mais pessoas a procurar alimentos no lixo, imigrantes e portugueses, garante. Não é preciso estar especialmente atento para ver gente retirar sacos dos contentores até encontrar peças de fruta, croissants ou bolos embalados.
Maria (chamemos-lhe assim) está de passagem e aproveita para levar uns bocados de leitão - para os cães, sublinha. Diz que é frequente ver pessoas tirar restos de comida dos contentores, mas para si mesmas. “Quem tem fome tem de comer, nem que seja do lixo”, observa.
Jorge Alves, presidente da Direcção Nacional da Associação Integrar, com sede em Coimbra, conhece o cenário, presenciou-o. “Acho que é desespero, já”, explica, frisando que as equipas de rua da Integrar estão atentas e em processo de abordagem a essas pessoas - que podem ter entre 18 e 80 anos -, com o intuito de as apoiar e encaminhar para espaços como a Cozinha Económica.
De acordo com Jorge Alves, “tem-se notado um aumento muito grande do número de pessoas à procura de comida em contentores do lixo”, em Coimbra. Em especial, na Baixa, junto de supermercados, ao anoitecer, quando “há menos circulação e não são tão visíveis”. Nota-se, sobretudo, desde o final do ano passado.
E “não é o típico sem-abrigo”, alerta o responsável, explicando que, entre as pessoas que revolvem os detritos, à procura de comida, há aquelas que “perderam o emprego e não recorrem à caridade”. “Preferem ir ao lixo, porque sentem que não as vêem, do que recorrer às instituições”, clarifica.
 “Não tinha conhecimento dessa situação em concreto; tinha conhecimento de situações de grande carência, um pouco por todo o lado”, declara, por seu lado, Oliveira Alves, director municipal de Desenvolvimento Humano e Social da Câmara de Coimbra. E aproveita para informar sobre um projecto de “apoio multidisciplinar” a indivíduos “em situação de emergência”, tendo com parceira a Cáritas Diocesana de Coimbra, mas aberto a outras entidades.
Trata-se de um fundo de solidariedade social com comparticipação financeira da Autarquia e da Cáritas, que, como explica, visa dar um apoio ?temporário? a pessoas que ficaram, subitamente, sem rendimentos, que estão sobreendividadas ou à procura de emprego, por exemplo. ?Dar a mão para ajudar a levantar?, clarifica. Não se sabe quantas serão, no concelho, até porque, como lembra Oliveira Alves, existe o fenómeno da ?pobreza envergonhada?. Há quem peça alimentos e roupas por e-mail.

http://jn.sapo.pt/paginainicial/pais/concelho.aspx?Distrito=Coimbra&Concelho=Coimbra&Option=Interior&content_id=1672723

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