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13/07/2009

Divida externa cresce devido controlo de sectores importantes da economia nacional por estrangeiros

Eugénio Rosa

Fala-se agora muito da Divida Externa Portuguesa. O Presidente da Republica manifesta periodicamente a sua preocupação com o crescimento insustentável da divida externa levando a pensar que o problema é recente. Manuela Ferreira Leite quer parar mesmo os investimentos públicos utilizando, como justificação, a elevada divida externa do País.

No entanto, aqueles que só agora mostram tanta preocupação pelo endividamento do País, durante muitos anos ignoraram essa divida, embora ela já estivesse a aumentar a um ritmo muito elevado. Mesmo alguns representantes do pensamento económico neoliberal dominante apresentavam-na como um indicador do desenvolvimento do País porque, segundo eles, estaria associado a mais investimento. Sócrates e os seus ministros da Economia e das Finanças ignoraram -na sempre. Mesmo agora recusam-se a falar dela e das consequências que ela vai ter para o desenvolvimento futuro do País e para as condições de vida dos portugueses. Mas todos procuram ocultar algumas das verdadeiras causas do crescimento da divida externa em Portugal.

Neste estudo vamos provar, utilizando apenas dados oficiais, o seguinte: (1) Que o crescimento vertiginoso da divida externa de Portugal não é recente, e durante muitos anos foi ignorado e mesmo ocultado por aqueles que agora manifestam grande preocupação com esse facto; (2) Que

esse crescimento se deve também ao controlo crescente de sectores importantes da economia nacional pelo capital estrangeiro, facto esse que todos procuram esconder.

EM 4 ANOS E 4 MESES DE GOVERNO DE SÓCRATES A DIVIDA EXTERNA PASSOU DE 64% DO PIB PARA 100,6% DO PIB

Como revela o quadro seguinte, construído com dados do Boletim Estatístico de Junho de 2009 do Banco de Portugal, a divida externa de Portugal disparou durante o governo de Sócrates.

QUADRO I – Crescimento da Divida Externa Liquida de Portugal durante o governo de Sócrates

PERIODO

PIB

Milhões euros

DIVIDA LIQUIDA EXTERNA DE PORTUGAL

Milhões euros

DIVIDA EXTERNA LIQUIDA % DO PIB

2004

144.128

92.205,3

64,0%

2005

149.123

104.681,4

70,2%

2006

155.446

125.833,5

80,9%

2007

163.190

148.974,4

91,3%

2008

166.197

161.531,1

97,2%

2009 (*)

163.736

164.689,1

100,6%

2009-2004

19.608

72.484

Variação em %:2009/06

13,6%

78,6%

57,2%

(*) Divida Externa Liquida em Março de 2009 segundo o Banco de Portugal; PIB : previsão para 2009 do Eurostat

FONTE: 2004-2008. Boletim Estatístico - Junho de 2009 - Banco de Portugal

Entre 2004 e 2009, o valor do PIB de Portugal cresceu, em valores nominais, ou seja, sem entrar com o efeito da subida de preços, 13,6%, enquanto a divida externa liquida portuguesa aumentou 78,6%. Em milhões de euros, o PIB cresceu 19.608 milhões €, enquanto a divida aumentou 72.484 milhões de euros, ou seja, 3,7 vezes mais. Como consequência, entre 2004 e 2009, a divida externa liquida do Pais passou de 64% do PIB para 100,6% do PIB. É um crescimento sem duvida insustentável, que vem do passado, e que não é apenas actual, facto esse que é ignorado por todos aqueles que só agora manifestam preocupação com o endividamento do País.

MAS O PROBLEMA DA DIVIDA EXTERNA É AINDA MAIS GRAVE, POIS FALA-SE SEMPRE DA DIVIDA LIQUIDA E NÃO DA DIVIDA TOTAL BRUTA QUE É MUITO MAIS ELEVADA

Os dados anteriores sobre a divida, que são aqueles habitualmente referidos e normalmente divulgados pelos media, enganam porque não correspondem à totalidade da divida do País. Aqueles dados referem-se apenas à Divida Liquida Externa, que se obtém deduzindo à Divida Externa Bruta, ou seja, a totalidade daquilo que o País efectivamente deve ao estrangeiro (o chamado PASSIVO do País) aquilo que ele tem a haver do estrangeiro (o chamado Activo). No entanto, o que o País efectivamente deve ao estrangeiro é a divida externa bruta, e é ela que tem de ser paga, e é sobre ela que se tem e pagar juros e dividendos. O quadro seguinte, construído também com dados divulgados pelo Banco de Portugal, mostra com clareza a dimensão dessa divida total efectiva.

QUADRO II – Valor da divida bruta total efectiva de Portugal

PERIODO

DIVIDA BRUTA EXTERNA DE PORTUGAL OU PASSIVO (Total que o País deve ao estrangeiro) Milhões €

DIVIDA LIQUIDA EXTERNA DE PORTUGAL (Passivo-Activo) Milhões €

Nº de vezes que a Divida Externa Bruta é superior à Divida Externa Liquida

2006

402.857,4

125.833,5

3,2

2007

444.137,7

148.974,4

3,0

2008

444.117,9

161.531,1

2,7

2009 (só até Março)

451.520,4

164.689,1

2,7

Aumento % 2006-2009

12,1%

30,9%

FONTE: Boletim Estatístico – Junho de 2009 – Banco de Portugal

Em 2006, a Divida Externa Bruta atingia 402.857,4 milhões de euros, ou seja, era superior 3,2 vezes à Divida Externa Liquida que era, nessa altura, de 125.833,5 milhões de euros. Entre Dezembro de 2006 e Março de 2009, a Divida Externa Bruta aumentou de 402.857,4 milhões de euros para 451.520,4 milhões de euros, e a Divida Externa Liquida subiu de 125.833,5 milhões de euros para 164.689,1 milhões de euros. Isto determinou que, já em Março de 2009, a Divida Bruta fosse 2,7 vezes superior à Divida Liquida Externa Portuguesa e 2,8 vezes superior ao PIB previsto para 2009. Portanto, para se poder ter uma ideia clara e verdadeira da verdadeira dimensão de endividamento de Portugal ao estrangeiro não são suficientes os valores da Divida Liquida, como é normalmente feito. Precisa-se também de conhecer a Divida Externa Bruta do País, pois é este o valor que terá de ser pago ao estrangeiro e sobre a qual se calculam os juros e os dividendos.

A DIVIDA EXTERNA TEM CRESCIDO MUITO EM PORTUGAL DEVIDO AO ELEVADO CONTROLO DE SECTORES IMPORTANTES DA ECONOMIA NACIONAL PELO CAPITAL ESTRANGEIRO

Um facto que tem sido sistematicamente ocultado por todos aqueles que só agora manifestam preocupação pela elevada divida externa assim como pelos defensores do pensamento económico neoliberal dominante é que o crescimento da divida externa portuguesa deve-se também ao elevado controlo da economia nacional pelo capital estrangeiro. O quadro seguinte, construído com dados divulgados pelo Banco de Portugal, prova precisamente isso.

QUADRO III – Rendimentos transferidos para o estrangeiro no período 2006 -2009

ANO

Tendo como origem Investimentos directos em Portugal

Tendo como origem Investimentos de carteira em Portugal

Tendo como origem outros investimento sem Portugal

TOTAL

Milhões de euros

2006

4.941,7

5.559,1

6.250,3

16.751,1

2007

4.607,6

6.391,4

8.163,1

19.162,2

2008

3.926,6

7.548,6

8.262,4

19.737,7

2009 (Até Abril)

1.297,0

2.697,9

1.330,8

5.325,6

2009 (Estimativa) (*)

3.890,9

8.093,6

3.992,4

15.976,9

SOMA (2006-09)

17.366,9

27.592,8

26.668,3

71.627,9

FONTE: Boletim Estatístico - Junho de 2009 - Banco de Portugal; (*) A Estimativa para 2009 tem como base o verificado nos 4 primeiros meses de 2009

Entre 2006 e Março de 2009, foram transferidos para o estrangeiro rendimentos no valor de 71.627,9 milhões tendo a seguinte origem: 17.366,9 milhões de euros rendimentos referentes a investimentos directos feitos por estrangeiros em Portugal; 27.592,8 milhões de euros relativos a aplicações em carteira de títulos, muitos deles isentos do pagamento de imposto (de acordo com o nº2 do artº 10, do Código do IRS); e 26.668,3 milhões de euros foram rendimentos transferidos para o estrangeiro tendo como origem outros investimento. Portanto, o défice da Balança Comercial (Exportações menos Importações) não é a única causa do elevado crescimento da divida externa do País, como o pensamento neoliberal dominante pretende fazer crer.

O quadro seguinte, igualmente construído com dados divulgados em Junho de 2009 pelo Banco de Portugal, também confirma o que se acabou de referir.

QUADRO IV – Lucros e dividendos gerados em Portugal transferidos para o estrangeiro

ANO

DIVIDENDOS E LUCROS TRANSFERIDOS DE PORTUGAL PARA O ESTRANGEIRO Milhões euros

2006

2.593,8

2007

3.489,3

2008

2.421,9

2009 (Até Abril)

604,4

2009 (Estimativa com base nos 4 primeiros meses de 2009)

1.813,1

SOMA (2006-2009)

10.318,1

FONTE: Boletim Estatístico - Junho de 2009 - Banco de Portugal

Entre 2006 e 2009, o valor de dividendos e lucros de investimentos directos feitos por estrangeiros em Portugal que foram transferidos para o estrangeiro somaram 10.318,1 milhões de euros. Durante o mesmo período a Divida Bruta Externa Portuguesa aumentou 48.663 milhões de euros e Divida Liquida Externa cresceu 38.855,6 milhões de euros. Fica assim claro que uma parte importante do crescimento da divida externa portuguesa deve-se à transferência de lucros e dividendos resultantes do elevado controlo de sectores importantes da economia nacional pelo capital estrangeiro. Não deixa de ser contraditório e esclarecedor que aqueles que se mostram só agora tão preocupados com o elevado endividamento do País não se cansem também de dizer que a solução está no aumento do investimento estrangeiro em Portugal, o que determinará um maior controlo da economia nacional pelo capital estrangeiro, o que provocará necessariamente que a transferência de lucros e dividendos para o estrangeiro cresça ainda mais, determinando um maior endividamento do País ao estrangeiro.

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