Entrevista a Walden Bello (Henning Heine (TAZ))
Henning Heine (HH): Senhor Bello, o Banco Mundial accionou energicamente o alarme, alertando para uma queda da economia mundial. Como estima o senhor os possíveis efeitos disto no Sul?
Walden Bello (WB): Serão massivos. Sofrerão sobretudo as economias nacionais que se abriram totalmente à globalização, ligando o seu crescimento à industrialização orientada para a exportação para mercados estrangeiros. Muito menos afectados serão os países com menor grau de abertura como, por exemplo, muitos Estados africanos.
(HH): Que efeitos tem já a crise?
WB: As exportações agrícolas da Argentina e do Brasil estão em queda livre. No leste da Ásia, as exportações já caíram drasticamente. Na China, de acordo com o governo, 20 milhões de trabalhadores perderam o emprego nos últimos meses. O valor do won coreano caiu cerca de 30%. As transferências de dinheiro dos trabalhadores emigrantes do sudeste asiático para os seus países de origem declinam espectacularmente; além disso, os desempregados indonésios e filipinos tendem cada vez mais a regressar à sua pátria.
(HH): A situação continuará a agravar-se?
WB: Claro, não tenha a menor dúvida. Estamos apenas no princípio duma derrocada de alcance planetário. Não sei quando bateremos no fundo, nem quanto tempo se manterá a economia mundial nessa zona abissal. A economia global é como um submarino atingido, que se afunda a toda velocidade em direcção ao solo marinho. Quando lá bater, ninguém sabe se a tripulação poderá ser resgatada e o submarino recuperado. Também não sabemos se as tentativas keynesianas de revitalização da economia conseguirão recuperá-la.
(HH): Espera que as decisões da reunião do G 20 consigam controlar as turbulências?
WB: Não. Não existem os pressupostos para um novo sistema de Bretton Woods. Cada um vai para o seu lado. A ideia de reformar o FMI e de com o Banco Mundial desempenharem um papel mais activo tem poucos apoios. Além disso, os acordos da Ronda de Doha não se concluirão na OMC (Organização Mundial de Comércio) porque muitos negociadores desconfiam da globalização. E no processo de Basileia evitou-se fixar a imprescindível lei reguladora do comportamento bancário. Muitas palavras bonitas sobre multilateralismo, mas poucos actos.
(HH): Como aprecia o programa da administração Obama relativamente à economia mundial?
WB: Em matéria de política económica, a administração Obama olha para dentro de casa e afasta-se da globalização e do livre comércio. É verdade que fala de multilateralismo e se manifesta contra o proteccionismo, mas até agora isso não são mais que fórmulas ocas. A prioridade de Obama é a estabilização da economia dos EUA. O resto do mundo pode esperar. Os EUA desempenharão retoricamente um papel dirigente no próximo encontro do G20 em Londres, no que respeita à arquitectura financeira global e ao robustecimento da regulação. Mas tudo se subordinou, na prática, aos seus interesses nacionais. Só quando conseguir travar a queda da economia norte-americana é que Obama se dedicará a temas de economia internacional.
(HH): E com a Europa, que se passa?
WB: A UE, tal como os EUA, concentra-se mais nos seus problemas internos. Temos de esperar para ver se vai decidir-se por esquemas estabilizadores válidos para toda a zona, ou se cai num pensamento nacional/estatal. Temo que, na Europa, tanto o apoio ao multilateralismo como as pretensões políticas de alcance planetário fiquem desgastados. Preocupa-me, além disso, o que irá acontecer com os emigrantes do Leste e do Sul, dado que a economia da UE encolhe a olhos vistos. O racismo e os preconceitos étnicos poderão começar a prosperar.
(HH): Que teria de ser feito com toda a urgência para evitar um ulterior descarrilamento da economia mundial?
WB: Perante os excessos económicos cometidos à escala planetária, uma coisa boa seria a “desglobalização”. Que deveria vir acompanhada por uma regionalização económica e economias nacionais robustecidas. A globalização arruinou as economias nacionais. Tornou-as vulneráveis até as conduzir à derrocada, na medida em que aniquilou as suas fronteiras protectoras e submeteu a produção e o comércio ao mercado mundial. Para nós, o desafio é saber como criar um sistema mundial no qual a participação no tráfego global de capital e serviços robusteça, em vez de debilitar, as economias nacionais.
(HH): Que opinião tem sobre o estado da esquerda e dos movimentos sociais actuais?
WB: A esquerda tem instrumental teórico para compreender a crise. A análise marxista, incluindo as intuições visionárias de Rosa Luxemburg – segundo a qual o capitalismo tende à sobre-acumulação e à sobre-produção – é particularmente importante aqui. O desafio é levantar um movimento de massas à escala mundial, dando simultaneamente, à escala nacional, uma resposta anti-capitalista à crise. Democracia na economia e mais democracia na política: esses deveriam ser os objectivos. Temos que nos apressar porque, se não oferecermos soluções de esquerda às pessoas, há o perigo de se deixarem convencer pela direita. Mas não podemos querer de modo algum que os Estados caiam num cenário como o dos anos 30.
ODiário.info- 22.04.09
À procura de textos e pretextos, e dos seus contextos.
22/04/2009
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