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08/09/2009

O regime de reparação dos Acidentes de Trabalho e das Doenças Profissionais não respeita a dignidade humana

Foi publicado a Regulamentação do Regime da Reparação dos Acidentes de Trabalho e das Doenças Profissionais, que mais uma vez não deu resposta cabal aos direitos dos trabalhadores vítimas da sinistralidade laboral e de doenças profissionais.

Desde há largos anos que a CGTP-IN vem lutando para que seja alterada a filosofia obsoleta da reparação, dado que constitui um gravíssimo problema de ordem social, mais uma vez não aconteceu sobretudo por falta de vontade política de afrontar os poderosos interesses do sector segurador.

O regime reparatório agora publicado está submetido a uma lógica economicista do lucro vigente no sector dos segurados privados, sem que nenhum Governo, incluindo o actual, se tenha mostrado seriamente empenhado em defender a alteração completa de filosofia subjacente ao regime da reparação dos acidentes de trabalho e doenças profissionais, no sentido de uma alteração substancial de perspectiva, à luz dos direitos de cidadania dos trabalhadores e tendo em vista o respeito pelo princípio da dignidade humana constitucionalmente valorado como fundamental.

No regime reparatório em matéria de acidentes de trabalho, é essencialmente protegido a integridade económica ou produtiva do trabalhador sinistrado, na medida em que os danos indemnizáveis são apenas a redução da capacidade de ganho ou de trabalho e, mesmo em caso de morte, o dano considerado é apenas a lesão de certa capacidade de rendimento que favorece determinadas pessoas, portadoras de uma dependência económica relativamente ao trabalhador falecido.

São desconsiderados os eventuais danos morais sofridos pelo trabalhador sinistrado e ou pelos seus familiares.

Por outro lado, a integridade produtiva indemnizável no domínio do acidente de trabalho também não é absoluta. Isto é, não se indemniza a lesão da capacidade produtiva integral do indivíduo, mas apenas aquela que é medida pelo seu salário contratual, abstraído completamente de quaisquer outros rendimentos realizados pelo indivíduo no exercício das suas aptidões pessoais.

Este regime não só desconsidera o trabalhador, enquanto ser humano e cidadão pleno, reduzindo-o à dimensão única da sua capacidade produtiva, mera peça de máquina, onde nem sequer se atende à integridade dessa mesma capacidade produtiva, limitando-se a considerar relevante a utilidade económica extraída pelo trabalhador sinistrado da relação de trabalho geradora do acidente no momento desse mesmo acidente.

O diploma continua ainda a defender o princípio da remição obrigatória para os acidentes de trabalho, quando podia ter optado pela remição prevista para as doenças profissionais.

A CGTP-IN não encontra fundamento para esta diferenciação, que não seja mais uma vez favorecer as seguradoras. No nosso entender continuamos a privilegiar que a remição das pensões deve ser sempre facultativa a requerimento do sinistrado ou benefício legal.

O diploma, entre muitos outros aspectos negativos, fixa ainda condição de recursos para definição do conceito de família a cargo e a possibilidade de redução ou extinção das pensões por incapacidade permanente em resultado da aplicação de ajuda técnica ou outro dispositivo técnico de compensação ou em resultado de reabilitação e reintegração profissional.

Finalmente, o regime da reabilitação e da integração profissional previsto, não é adequado a garantir devidamente os direitos dos trabalhadores abrangidos, especialmente na medida em que atenua e minimiza a responsabilidade das entidades patronais envolvidas.

O presente diploma constitui mais uma oportunidade perdida, na medida em que não introduz nada de novo nem aponta para a única solução compatível com o princípio da reparação integral dos danos provocados pela sinistralidade laboral.

A CGTP-IN não pode deixar de lamentar que o Presidente da República promulgasse este diploma nas questões fundamentais, que apesar de alguns aspectos de melhoria pontuais, não se mostra globalmente mais favorável à protecção dos trabalhadores sinistrados, limitando-se a manter o status quo, ou seja, uma reparação com a mesma visão do trabalhador como peça da máquina que se avariou, vinda dos primórdios do século passado.

A CGTP-IN continuará a sua acção até que o regime de reparação seja integral dos danos provocados.

CGTP-IN - 07.09.09

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