A Frente Comum formalizou o pedido de apreciação preventiva da constitucionalidade da redução salarial prevista no OE para 2011. Acções de luta estão marcadas para Janeiro.
Numa iniciativa conjunta, a Frente Comum de Sindicatos da Administração Pública e a FNSFP/CGTP-IN entregaram na semana passada, na Presidência da República, o pedido formal para que seja requerida a posição do Tribunal Constitucional sobre o decreto da AR que aprova o Orçamento do Estado e as normas que impõem uma diminuição dos salários dos trabalhadores no próximo ano.
A Federação Nacional dos Professores, a propósito da constitucionalidade desta medida, declarou segunda-feira que «espera que, pelo menos, 23 deputados (dez por cento do total), sobretudo dos grupos parlamentares que se opuseram a este OE, requeiram a fiscalização sucessiva» da redução salarial.
O Sindicato dos Jornalistas escreveu ao Presidente da República, apelando-lhe a que exerça o direito de veto sobre o diploma que determina o corte de salários dos trabalhadores da RTP, da Lusa e do Jornal da Madeira – que integram o sector empresarial do Estado –, ou que, em alternativa, requeira ao TC a apreciação preventiva da sua constitucionalidade.
O Conselho Geral do Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local, por seu turno, repudiou globalmente o Orçamento, salientando que nele o Governo «pretende impor medidas para reduzir o défice das contas públicas, à custa dos direitos sociais e laborais, e salvaguardar os lucros». Para aquele órgão do STAL/CGTP-IN, como se refere numa resolução que aprovou dia 17, as alegadas soluções apresentadas «não são mais do que o aprofundar das políticas neoliberais de regressão social, levadas a cabo nas últimas décadas e que conduziram o País à situação de endividamento externo». Para combater tais medidas, o caminho é «a intensificação da acção reivindicativa, dando continuidade à grandiosa greve geral de 24 de Novembro e à disponibilidade dos trabalhadores da Administração Local». Desde já, a estrutura sindical empenha-se na mobilização para as acções agendadas para Janeiro pelos sindicatos da Frente Comum, nomeadamente:
- interpor providências cautelares nos tribunais, a que se poderá seguir (se as providências cautelares não tiverem efeito) a entrega de requerimentos de impugnação nos serviços administrativos dos diferentes locais de trabalho;
- participar num plenário nacional junto à residência oficial do primeiro-ministro.
Fortes fundamentos
O pedido da Frente Comum e da Federação da Função Pública foi fundamentado em pareceres do departamento de Contencioso do Sindicato dos Enfermeiros Portugueses e do juiz-conselheiro jubilado Guilherme Fonseca.
No primeiro, demonstra-se que o diploma é «irremissivelmente inconstitucional» por vicio in procedendo (incumprimento de regras processuais), uma vez que nem o OE nem o corte dos salários foram sujeitos à apreciação das organizações sindicais, antes da sua aprovação – e deveriam ter sido, por estas serem titulares do direito constitucional a participar na elaboração de legislação do trabalho, mas também para dar cumprimento ao princípio da Lei fundamental, que obriga à participação das organizações representativas dos trabalhadores na definição das principais medidas económicas e sociais.
Apenas a 20 de Outubro foram publicadas no BTE e postas à apreciação pública «normas constantes da Proposta de Lei do Orçamento do Estado para 2011 com incidência nos trabalhadores com relação jurídica de emprego regulada pelo Código do Trabalho» – quando a Proposta de Lei tinha sido aprovada no dia 14 e entregue na AR dia 15. Além de «inócua», a publicação constituiu uma «formalidade sem sentido útil».
No dia 27, no Diário da AR, foi submetido à apreciação pública o capítulo que continha as disposições relativas aos trabalhadores do sector público, decorrendo o prazo de pronúncia das associações sindicais até 15 de Novembro. Mas, a 3 de Novembro, o OE foi discutido e votado na generalidade no Parlamento, ficando por cumprir o direito de audição dos representantes dos trabalhadores.
Guilherme Fonseca defende que a redução das remunerações dos trabalhadores do sector público padece de inconstitucionalidade material. O juiz-conselheiro jubilado do Tribunal Constitucional e do Supremo Tribunal de Justiça considera que a Constituição impõe que o OE respeite «obrigações decorrentes da lei ou de contrato», aqui se incluindo as obrigações relativas ao contrato de trabalho. O cumprimento destas obrigações pré-existentes (anteriores ao diploma que aprova o OE) significa o pagamento integral da retribuição devida. Na Constituição, no Código do Trabalho e na legislação específica da Administração Pública (RCTFP), está inscrita a proibição de diminuição dos salários, que não é respeitada no OE, no qual «não foram tomadas em conta as obrigações decorrentes de contrato, em que são parte o Estado e os trabalhadores do sector público».
Poderiam «razões imperiosas de interesse público» sobrepor-se aos valores protegidos pela Constituição. Mas, no processo legislativo, «não se demonstra que não estaria aberto um outro caminho»; e não pode ser invocado qualquer «estado de necessidade» a propósito das dificuldades financeiras, «pois os órgãos de direcção política têm mantido o controlo da dívida pública e, pelo menos, nenhuma medida legislativa de imediato foi tomada, com um sentido tão gravoso como o das medidas ora em causa».
http://www.avante.pt/pt/1935/trabalhadores/111986/
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