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30/12/2010

Caridades

João Frazão

António Mexia é, definitivamente, um bom rapaz.
Nem o coração mais empedernido deixaria de se sentir embevecido com o gesto altruísta do presidente da EDP a entregar um parzito de camisolas usadas e um boneco piroso para a empresa que dirige distribuir pelos pobrezinhos.
Nesta overdose de caridade que a comunicação social dominante nos tem servido nas últimas semanas – em que os restaurantes fazem gala de oferecer os restos aos desvalidos da vida, as grandes superfícies competem para ver qual delas vende mais (e ganha mais com isso) presentes para distribuir a quem mais precise e as televisões pedem que quem tem pouco ligue para números de valor acrescentado enquanto eles embolsam o valor da publicidade dos intervalos das galas – ver António Mexia muito empenhado numa destas operações não deixa margem para dúvidas.
A EDP teve, em 2009, apenas 1024 milhões de euros de lucros. Logo, 2 milhões e 700 mil euros todos os dias. Compreende-se que, para fazer caridade, tenha que pedir a outros para distribuir umas roupinhas e uns brinquedinhos aos mais desfavorecidos. E que ao mesmo tempo lhes reclame mais 3,8% na factura mensal da electricidade.
António Mexia, por seu lado, o administrador mais bem pago das empresas do PSI-20, recebeu em 2009 qualquer coisa como 3,1 milhões de euros.
Portanto não espanta o seu empenhamento, o seu altruísmo, acondicionado em duas sacas compradas para o efeito, com a entrega, por mera coincidência acompanhada pelas câmaras de televisão, de duas pecinhas de alta costura, já gastas mas ainda muito apresentáveis e do tal boneco piroso. Só um, pois era o único que sobrava lá em casa.
Assim como não espanta que Mexia, no dia em que anunciou um novo aumento dos lucros em 4%, tenha anunciado a sua satisfação com a aprovação do Orçamento do Estado para 2010. O tal em que se consumou o tango do PS com o PSD, apadrinhado pelo Presidente da República, e que vai provocar mais desemprego, mais dificuldades e mais pobreza.
Mas não há problema. Para o ano, Mexia e a EDP vão oferecer, caridosamente, mais duas camisolinhas. E um par de peúgas!

http://www.avante.pt/pt/1935/opiniao/111957/
 

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