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20/03/2009

Les Classes Sociales dans la Mondialisation, Anne-Catherine Wagner

(Wagner, Anne-Catherine (2007), Les Classes Sociales dans la Mondialisation, Paris, La Découvert.)

As desigualdades de classe produzem-se, também, à escala internacional. O lugar ocupado no espaço nacional das classes influencia as possibilidades de aquisição de recursos no estrangeiro, mas a legitimação ou o acesso dos/aos lugares dominantes na hierarquia social dependem em muito do “capital internacional” acumulado.

Em Les Classes Sociales dans la Mondialisations (2007), Annes-Catherine Wagner defende que as lógicas de hierarquização e diferenciação social num dado país fundam-se, pelo menos parcialmente, no acesso desigual a recursos culturais, relacionais e simbólicos de natureza internacional. A autora começa por referir que o cosmopolitismo é uma disposição cultural que foi ao longo da história bastante valorizada e cultivada pela aristocracia e pela alta burguesia. A aprendizagem de línguas estrangeiras, a ampliação das referências comportamentais e o aprofundamento do conhecimento acerca da história e cultura de outros países (nomeadamente dos países dominantes) eram entendidos como disposições culturais e identitárias definidoras da pertença às classes dominantes.
Actualmente, a aquisição de competências e modos de pensar e agir cosmopolitas mantém a sua importância nos processos de estratificação social das sociedades, no sentido em que a posse ou destituição destes recursos é operativa na determinação das posições no espaço das classes. Segundo a autora, os quadros de socialização escolar e familiar dos descendentes das classes mais favorecidas potenciam a aprendizagem de línguas estrangeiras, a valorização dos assuntos internacionais, alargam a amplitude das suas referências culturais, dos seus modos de pensar e permitem construir redes de sociabilidade que extravasão o espaço nacional. Anne-Catherine Wagner defende que as desigualdades sociais na mundialização não têm apenas uma natureza remuneratória, qualificacional ou patrimonial, mas também simbólica e cultural:

“O cosmopolitismo das classes altas permite-lhes perceber como próximo aquilo que se passa longe delas. O domínio das línguas, o conhecimento de vários países, o hábito de viajar, a facilidade no relacionamento com os estrangeiros define as formas específicas, internacionais, do seu capital cultural e social. Para analisar os usos de uma cultura internacional no seio das classes superiores, é necessário ter em conta os dois sentidos desse termo: a cultura internacional é uma mistura de bens simbólicos desigualdade distribuídos; é também uma cultura no sentido que lhe é dado pelos antropólogos, isto é, um conjunto de regras, de práticas e de crenças comuns a um grupo” (p.43, tradução própria).

Neste sentido, as desigualdades de classe na mundialização produzem-se também na esfera do reconhecimento social do indivíduo, do seu status, o qual, segundo a autora, é um recurso decisivo na definição das suas possibilidades trajectoriais – nomeadamente no mercado de trabalho.
O valor do capital internacional varia, porém, consoante a sua origem nacional. A autora, refere, por exemplo, que existe um reconhecimento desigual do bilinguismo. Enquanto o domínio predominante da língua inglesa pelas classes sociais superiores em França é entendido como um indicador de cosmopolitismo, a utilização da língua de origem por parte dos imigrantes é, pelo contrário, uma prática estigmatizada, classificada social e politicamente como um entrave à integração no país de acolhimento.
Neste sentido, a relevância estruturante do capital internacional decorre da sua valorização simbólica, da cotação social alcançada. Anne-Catherine Wagner defende que a manipulação simbólica dos recursos internacionais é levada a cabo pelas classes dominantes, as quais tendem a reconhecer como legítimas e valiosas as disposições por elas detidas.

“As classes dominantes têm o poder de fazer reconhecer os seus atributos como elementos que conferem e legitimam uma superioridade social. É na possibilidade de escolher, em função da sua rentabilidade, entre a mobilidade e a estabilidade, o cosmopolitismo e o fechamento, que residem os privilégios das classes dominantes na mundialização” (103, tradução própria).

Frederico Pincho Cantante- Observatório das Desigualdades - 20.03.09

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