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02/12/2010

Irlandeses protestam contra novas medidas: A pão e água

Contra a sangria imparável do povo trabalhador, os sindicatos irlandeses convocaram um protesto que teve uma adesão massiva. Mais de 150 mil pessoas, segundo os organizadores, desfilaram no sábado, 28, na capital do país.
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Foto LUSA
Poucos dias após a intervenção do Fundo Monetário Internacional (FMI) e da apresentação de mais um intolerável pacote de medidas de austeridade, o terceiro desde o rebentamento da crise em 2008, o povo irlandês saiu à rua para realizar uma das maiores acções de protesto dos últimos anos.
Os motivos são conhecidos. À generalidade da população já duramente sacrificada, o governo quer impor nos próximos quatros anos um severo programa que prevê arrecadar 15 mil milhões de euros. Destes, 10 mil milhões resultam em cortes cegos nas despesas, no essencial sociais, e os restantes cinco mil milhões de aumentos de impostos.
Assim, com a agravante de 40 por cento deste plano draconiano, ou seja seis mil milhões de euros, terem de ser realizados no decorrer do próximo ano, Dublin anunciou, dia 24, que pretende reduzir as prestações familiares e pensões em dez por cento e aumentar a idade da reforma para os 68 anos. Em paralelo, 24 750 empregos públicos serão extintos, regressando o efectivo do Estado aos níveis de 2005.
As despesas de educação e de saúde e os apoios à agricultura sofrerão um corte de três mil milhões de euros. Por último, mas não menos escandalosa, é a redução do salário mínimo nacional, cujo valor horário deverá passar de 8,65 para 7,65 euros.

Menos salários e mais impostos

Do lado das receitas suplementares, o imposto sobre o valor acrescentado (IVA) irá aumentar para 23 por cento, o que se traduz numa cobrança adicional de 620 milhões de euros. Soma-se um novo imposto sobre a água, e um aumento geral das propinas escolares.
Em contrapartida, o governo do conservador Brian Cowen não quer tocar no imposto sobre os lucros das empresas que é mantido, na proposta orçamental, nos módicos 12,5 por cento, uma das mais baixas taxas fiscais da União Europeia, onde este imposto representa em média 24,7 por cento.
Dado que tanto a Alemanha como Paris vinham pressionando para que esta taxa fosse aumentada, o governo irlandês apressou-se a indicar que se trata de «uma pedra angular da nossa política económica voltada para a livre empresa». Na verdade, mostrando quem manda realmente no país, algumas multinacionais avisaram nas últimas semanas que qualquer agravamento da tributação dos seus lucros poderia significar a deslocalização das respectivas unidades.

O espectro da falência


Dublin sonha em reduzir o défice público para os três por cento em 2014. (Recorde-se que este ano o buraco nas contas do Estado representa 32 por cento do PIB, valor obtido depois da contabilização dos cerca de 50 mil milhões, um terço do produto, injectados no sistema bancário falido). Mas para isso, a economia teria de crescer 2,75 por cento já no próximo ano.
Ora, depois do colapso da economia em 2009 (-7%) e de um cenário pouco animador para este ano (14% de desempregados), é improvável que as tradicionais soluções para salvar os lucros do capital possam conduzir a uma recuperação da economia.
Tanto mais que todo o esforço orçamental parece ser ínfimo quando comparado com os montantes já despejados na banca e que terão de continuar para evitar a falência. À «nacionalização» dos prejuízos do Anglo Irish Bank logo em 2009, seguiu-se a intervenção estatal no Allied Irish Banks, que revelou, na semana passada, ter registado uma quebra nos depósitos de 13 mil milhões de euros, a que se soma uma queda em bolsa de 70 por cento desde o início do ano.
A falência ameaça igualmente o Bank of Ireland, devendo passar muito em breve para a esfera pública, uma vez que já perdeu 90 por cento do seu valor em bolsa desde o início da crise.
Face ao descalabro da banca e prevendo os inevitáveis efeitos recessivos das drásticas medidas de austeridade, que já estão a reduzir à indigência muitos milhares de irlandeses, o anúncio da «ajuda» do FMI e da UE no montante de 85 mil milhões de euros (35 milhões dos quais se destinam à banca), não contribuíram em nada para acalmar os credores. Na mesma semana, estes elevaram a taxa de juro de novos empréstimos para nove por cento.
A era do capitalismo está a chegar ao fim, e ante o povo irlandês coloca-se a tarefa cada vez mais urgente de o suprimir, sob pena de desaparecer do mapa. Como gritaram os manifestantes, no sábado, «os cortes orçamentais salvam a banca, não a Irlanda».

http://www.avante.pt/pt/1931/europa/111511/

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