O diploma que deveria facilitar o acesso dos trabalhadores aos tribunais em caso de despedimento tem vindo a revelar-se uma dor de cabeça. O Código do Processo de Trabalho (CPT), que vigora desde 1 de Janeiro, está a ser alvo de interpretações diversas, criando dificuldades acrescidas a quem opta pela contestação.
O entendimento do CPT varia consoante o juiz e mesmo dentro de um mesmo tribunal as regras estão a ser interpretadas de forma diferente. Alguns juízes defendem que apenas os despedimentos efectuados em 2010 podem ser contestados através de um simples requerimento, enquanto outros estão a aplicar os novos procedimentos a todos os processos que deram entrada desde o início do ano, independentemente da data em que ocorreu o despedimento.
"Há uma agitação enorme em torno do Código de Processo de Trabalho", confessa o advogado Pedro Furtado Martins. "Cada juiz tem uma interpretação diferente, mas, na minha opinião, a lei é clara: o novo CPT aplica-se a todas as acções que dão entrada nos tribunais a partir de 1 de Janeiro", acrescenta, por seu turno, Fausto Leite, também advogado e que tem entre mãos vários processos de impugnação de despedimento.
Quem acaba prejudicado são os trabalhadores, que tinham esperança de ver o acesso aos tribunais facilitado e o seu processo tratado de forma urgente, duas das principais mudanças introduzidas pelo CPT.
Alguns juízes defendem que o código apenas se aplica aos despedimentos efectivados a partir de 1 de Janeiro de 2010 e têm estado a recusar todos os requerimentos, obrigando os trabalhadores a instaurarem uma acção com a ajuda de um advogado. Outros defendem que a nova lei aplica-se a todos os processos que deram entrada desde Janeiro, mesmo que o despedimento tenha ocorrido no ano passado. E dentro do mesmo tribunal pode haver várias interpretações. É o que acontece nos Tribunais do Trabalho de Lisboa ou de Sintra. No Porto, os quatro juízes do Tribunal do Trabalho têm defendido que o novo CPT apenas se aplica aos despedimentos ocorridos em 2010 e desde que o processo disciplinar também se tenha iniciado depois de 1 de Janeiro. "Até melhor opinião, esta tem sido a nossa interpretação. A ideia é evitar mudar as regras a meio do jogo. Quando o despedimento ocorreu foi ao abrigo de uma determinada legislação", realça o juiz-presidente daquele tribunal.
Paulo Silva garante que desde o início do ano tem recebido "vários" requerimentos de trabalhadores, mas todos os que dizem respeito a situações ocorridas em 2009 são indeferidos e os trabalhadores obrigados a interpor uma acção e a procurar um advogado. "Do ponto de visto do trabalhador é mais complicado", reconhece.
O CPT veio facilitar o acesso dos tra- balhadores aos tribunais sempre que pretendam contestar um despedimento, e desde que a empresa invoque inadaptação ou culpa do trabalhador ou extinção do posto de trabalho. O prazo de impugnação reduziu-se de um ano para 60 dias, mas, em compensação, basta que o despedido preencha um formulário e o entregue no tribunal para que o processo se inicie, cabendo depois ao empregador provar que o despedimento é lícito. O CPT estabelece que estes processos serão alvo de acção especial, passando à frente de outros processos.
Contudo, a aplicação destas regras parece não estar clara na lei, o que leva a que nem todos os processos estejam a ser tratados da mesma forma. Embora o CPT diga que se aplica "às acções que se iniciem após a sua entrada em vigor", a interpretação nem sempre tem sido esta.
Perante este impasse, o problema será resolvido por via da jurisprudência, já que o Governo não coloca a hipótese de fazer uma correcção ao decreto-lei ou de emitir uma norma interpretativa. Questionado pelo PÚBLICO, o Ministério do Trabalho respondeu que "não se pronuncia sobre dúvidas de interpretação e aplicação da lei, porque tal não está nas suas competências, cabendo aos tribunais fazer esse trabalho".
http://economia.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1424857
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