A fina flor do empresariado da mídia, algumas cabeças coroadas do jornalismo pátrio e convidados latino-americanos reuniram-se na segunda-feira (1/3), em São Paulo, no fórum "Democracia e liberdade de expressão", organizado pelo Instituto Millenium. A entidade, fundada em 2006, como informa a Folha de S.Paulo (2/3), tem entre seus mantenedores os empresários Roberto Civita, do Grupo Abril, e João Roberto Marinho, das Organizações Globo.
Afora os testemunhos dos jornalistas Adrián Ventura, do jornal argentino La Nación, do venezuelano Marcel Granier, dono do canal RCTV, e do equatoriano Carlos Vera sobre a situação da mídia em seus países, no evento o centro das atenções – e alvo das críticas – foi o chamado "controle social da mídia", expressão que provoca acessos de urticária nos proprietários de empresas de comunicação. O tema voltou à baila no Brasil a partir da realização da 1ª Conferência Nacional de Comunicação e da divulgação da terceira versão do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH 3).
Esses mesmos empresários – e os seus veículos – há tempos movimentam-se por intermédio de suas entidades de classe (ANJ, Abert e ANER) no sentido de interditar o debate sobre o direito à comunicação e o papel da mídia enquanto serviço público, cuja operação deve estar sujeita a um marco regulatório democraticamente construído e socialmente justo. Essa discussão passa ao largo da pauta prioritária dos veículos. Ocorre que, se questões como essas não estão nos veículos jornalísticos, então elas não estarão na agenda pública, então... elas não existem.
Da parte do governo, o ministro Hélio Costa, das Comunicações, presente ao encontro, apressou-se em garantir que o Executivo não aventa a hipótese de estimular o debate sobre o dito controle social. "Em nenhum momento isso foi discutido dentro do governo federal. Consideramos essa questão absolutamente intocável", afirmou, de acordo com o Estado de S.Paulo (2/3).
Da parte do partido do governo, o deputado Antonio Palocci (PT-SP), um dos coordenadores da campanha presidencial da ministra Dilma Rousseff, sublinhou, segundo O Globo (2/3), que "vez ou outra aparece no governo e em outros setores a ideia de interferência estatal na qualidade da comunicação, como aconteceu no Plano Nacional de Direitos Humanos. Não quero condenar o PNDH, mas não concordo com a forma como foi colocada a questão da mídia – disse Palocci, antes de frisar que o Estado não pode dizer a maneira adequada de os jornais funcionarem".
Sem vontade
E tome confusão, porque o embaralhamento da discussão interessa sobremaneira àqueles que querem evitar o debate sobre o papel da mídia numa sociedade que se quer democrática. Um exemplo? Na bateria de críticas que se faz ao PNDH 3, em momento algum se esclarece que ali se propõe que o tal "controle social" deve ser exercido, sim, sobre os canais públicos de radiodifusão que operam sob regime de concessão. Não se trata, portanto, de "controlar" a pauta e a operação dos meios privados, como os jornais. Não se trata de censura, como a grande mídia gosta de repetir a torto e a direito. Trata-se de fazer cumprir a Constituição, observar de perto o comportamento da mídia, qualquer mídia, e disseminar as avaliações obtidas desse acompanhamento. Algo, aliás, que este Observatório faz há 14 anos.
Convém não esquecer que estão lá, no capítulo 5 da Constituição de 1998 – "Da Comunicação Social" –, a proibição de monopólios ou oligopólios dos meios de comunicação, os princípios educativos a ser observados na programação de rádio e TV, o estímulo à produção independente e a promoção da cultura regional, a regionalização da produção e o respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família.
Por que a sociedade não tem o direito de controlar a observância desses princípios? Por que essas normas ainda não foram regulamentadas quase 22 anos depois da promulgação da Constituição? Por que não discutir abertamente a propriedade cruzada dos meios e as concessões de radiodifusão a parlamentares?
Enquanto não se clarear esse debate, e a grande mídia demonstra não ter vontade alguma disso, fica valendo apenas a voz dos donos. E isto não é o bastante.
http://www.observatoriodaimprensa.com.br/artigos.asp?cod=579JDB011
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