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16/12/2009

Greve nos hiper e supermercados também atinge comércio

Ana Rute Silva, Luís Villalobos

A greve convocada pela Federação Portuguesa dos Sindicatos do Comércio, Escritórios e Serviços (FEPCES) para a véspera de Natal poderá afectar não só os hipermercados, mas também todo o chamado comércio moderno, que inclui lojas como o IKEA, a Massimo Dutti ou a FNAC.

Esta é a primeira vez que a FEPCES, afecta à CGTP, convoca uma paralisação para 24 de Dezembro, em protesto contra o novo contrato colectivo de trabalho que está a ser negociado com a Associação Portuguesa das Empresas de Distribuição (APED). A APED tem mais de cem associados e o contrato em discussão afecta desde supermercados a lojas de roupa.

Segundo Manuel Guerreiro, presidente do Sindicato dos Trabalhadores do Comércio, Escritórios e Serviços de Portugal (CESP), há 17 mil trabalhadores sindicalizados que, pelas contas do PÚBLICO, representam cerca de 20 por cento do total que o sector da distribuição empregava em 2008 (81.267). Contudo, os valores não são confirmados por Luís Vicente Dias, presidente da APED, que aponta para "um dígito" o nível de representatividade. "É baixíssima", contrapõe.


Paragem de 24 horas

O pré-aviso de greve foi enviado ontem aos patrões da grande distribuição por fax e prevê uma paralisação das zero às 24 horas na véspera de Natal "em todo o território nacional". Surpreendida com o anúncio, a APED diz que a atitude dos sindicatos é "altamente irresponsável", e admite que pode "atentar contra o normal funcionamento do comércio nesta época do ano, [pondo] em causa o direito ao abastecimento dos consumidores e das famílias portuguesas". A época natalícia chega a pesar 20 a 25 por cento do total da facturação anual na distribuição - para o sector dos brinquedos vale 60 por cento.

A FEPCES contesta a proposta das empresas de aumentar o número de horas semanais de trabalho flexível para "o máximo previsto pela lei". O período normal das oito horas diárias pode ser aumentando em quatro horas, até às 60 horas semanais. Esse trabalho extra é compensado com tempo. "A proposta das empresas da distribuição moderna é desumana porque quer legalizar e generalizar algumas práticas ilegais que já vêm pontualmente praticando, e fazem a vida dos trabalhadores num Inferno com as chamadas escalas diárias", dizem.

A APED refuta as acusações e esclarece que o que foi apresentado "não é mais do que a lei geral". "O que está em causa é uma flexibilização nas horas trabalhadas, para as adequar ao fluxo de clientes, que serão depois compensadas", diz Luís Vicente Dias. Também António Rousseau, director-geral da APED, garante que não se pretende "aumentar o período normal de trabalho". O actual contrato colectivo já prevê 50 horas semanais - duas horas diárias ou dez semanais de trabalho flexível - e os patrões da grande distribuição pretendem chegar às 60 "que estão no Código do Trabalho".

"Só é para usar em circunstâncias que o justifiquem e com a contrapartida do descanso dos trabalhadores", assegura António Rosseau. A APED diz ainda que a greve é "totalmente inútil", até porque as alterações à flexibilidade laboral têm de ser aprovadas pelos trabalhadores na negociação colectiva, não podendo ser impostas pelo empregador.

O presidente da Sonae, Belmiro de Azevedo, grupo que detém insígnias como o Continente, afirmou ontem não acreditar que a ameaça de greve seja concretizada. Isto porque, defendeu, os sindicatos seriam "duplamente irresponsáveis" ao criar desconforto a milhões de portugueses por um pequeno ataque de baixa qualidade". No caso da Jerónimo Martins, dona do Pingo Doce, fonte oficial afirmou que a empresa está "inteiramente de acordo com o comunicado da APED". Sobre os eventuais efeitos da greve, a mesma fonte declarou que irá sempre tentar "acautelar os interesses dos clientes".

A nível europeu, cerca de 18,5 milhões de pessoas trabalham no sector retalhista (e não apenas na distribuição moderna), a esmagadora maioria por conta de outrem. Tal como no caso das horas e dias de abertura, que diferem de país para país (ver caixa), também as leis laborais e os horários de trabalho variam entre os diferentes Estados. Não foi possível, no entanto, ter uma noção exacta das diferenças, já que nenhum dos organismos ou pessoas contactadas pelo PÚBLICO soube prestar essa informação, incluindo a Eurocommerce, organismo europeu em que a APED está filiada.

Um estudo da Comissão Europeia refere que a Holanda é um dos países onde há mais flexibilidade laboral. É, também, onde o part-time está mais disseminado no sector retalhista, tal como o Reino Unido e a Alemanha. Portugal é o país da Europa com menor peso de colaboradores no comércio a retalho em part-time.

http://economia.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1414085

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