55% dos trabalhadores portugueses declaram que o salário é fixado sem qualquer negociação e valorizam o papel dos sindicatos, mas mais de dois terços não estão nem nunca estiveram sindicalizados.
Mais de metade dos trabalhadores portugueses (55%) declaram que o salário é determinado pelo empregador sem qualquer negociação ou consulta prévia. Esta é uma das conclusões de um estudo de António Dornelas, investigador do ISCTE, que retrata um país com sindicatos pouco influentes e trabalhadores descontentes com as decisões dos patrões.
A soma da percentagem de trabalhadores que refere que o salário é definido sem qualquer consulta (55%) com a dos que refe- re que é decidido depois de uma negociação individual (31%) sugere uma fraca influência dos sindicatos na definição dos salá- rios. "A eficiência da regulação social é reduzida. Os trabalhadores estão à mercê do patrão", conclui ao DN o ex-coordenador do Livro Verde das Relações Laborais, que esteve na origem da última revisão do Código do Trabalho. As decisões dos empregadores - que pretendem congelar salários - serão por isso "mais importantes para definir o aumento salarial do ano que vem".
Apenas 12% dos trabalhadores inquiridos para o estudo Relações Laborais na Empresa, publicado este ano, referem que a definição do salário é consequência da convenção colectiva. "Deve-se ao que se chama o wage drift, isto é, o desajustamento salarial. As pessoas ganham mais do que os salários das convenções colectivas. Temos uma negociação colectiva com uma alta taxa de cobertura. Mas apesar do elevado nível de regulamentação, a capacidade de regulação é reduzida", justifica.
Por outro lado, 59% dos inquiridos declaram que os empregadores alteram horários de trabalho sem qualquer consulta prévia. "Os patrões preferem métodos unilaterais e os sindicatos não foram capazes de jogar o jo-go da negociação da flexibilidade. A contrapartida da rigidez é o unilateralismo patronal", defende o antigo secretário de Estado do Emprego e da Formação do Governo de António Guterres.
Os trabalhadores não estão satisfeitos. Apenas 16% consideram ter uma remuneração elevada e 38% identificam boas oportunidades de progressão. "Tendo em conta que quem toma as decisões são os empregadores, isto revela que descontentamento com as decisões dos empregadores é muito forte. As pessoas podem não protestar... mas isso é outra discussão."
Realizado no âmbito do International Social Survey Programme (ISSP), o estudo agora publicado baseou-se num inquérito a 1078 indivíduos concluído no início de 2007. Ter-se-á alterado muito o cenário? "Não há nenhum indicador que o sugira", responde o autor.
O papel dos sindicatos é muito valorizado pelos trabalhadores, nomeadamente no que respeita à protecção do emprego e à melhoria das condições de trabalho. Apesar disso, mais de dois terços dos inquiridos afirmam que nunca estiveram sindicalizados. A taxa de sindicalização de 18,4% identificada no estudo é maior entre os que têm contratos sem termo (22,6%) e menor entre precários (11%) e prestadores de serviços (2,1%).
"As pessoas têm uma opinião mais favorável sobre a ideia do sindicalismo do que sobre os sindicatos efectivamente existentes. O que traduz uma crítica implícita aos comportamentos sindicais concretos", refere o investigador, sem mais explicações. Mais de metade dos trabalhadores considera que nenhum sindicato é eficaz.
Em dois terços das empresas não há qualquer forma de representação colectiva dos trabalhadores. Não admira, por isso, que 80% declarem que preferem resolver conflitos directamente com o empregador e que quatro em cada cinco nunca tenha feito greve. "São muito marcados os traços da individualização das relações laborais", conclui.
http://dn.sapo.pt/bolsa/interior.aspx?content_id=1455889
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