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12/02/2010

Nova era de perda de poder de compra à vista no Estado

João Ramos de Almeida, Sérgio Aníbal

Se se vier a confirmar a intenção do Governo de não permitir aumentos reais na função pública até 2013, os trabalhadores do Estado vão registar, num período de 14 anos, 13 em que a sua actualização salarial ficou abaixo da inflação.

A possibilidade de o Governo vir a incluir na actualização do Programa de Estabilidade e Crescimento, a garantia de que não haverá aumentos reais de salários até que se atinja um valor do défice inferior a três por cento em 2013, como prometido a Bruxelas, foi avançada pelo "Diário Económico", na sua edição de ontem, mas não foi confirmada pelos membros do Governo.

A verificar-se, não será mais do que uma repetição do cenário vivido na Administração Pública durante a quase totalidade da última década. Em algumas ocasiões foram as previsões de inflação do Governo que falharam drasticamente, noutras foi a opção de limitar o crescimento da massa salarial da função pública, mas o resultado foi quase sempre o mesmo: os funcionários públicos que não conseguiam uma promoção ou uma subida de escalão perdiam invariavelmente poder de compra.

Depois de um final dos anos 90 em que o Estado foi mais generoso, os primeiros sinais de contenção surgiram no ano 2000, quando um aumento salarial de tabela de 2,5 por cento não chegou para compensar uma variação dos preços na economia de 2,9 por cento.

A partir daí e até 2009, a tendência manteve-se, acentuando-se as perdas do poder de compra quando, entre 2005 e 2007, o congelamento dos salários nominais foi prática corrente.

O ano de 2009 foi a grande excepção. Ao fim de nove anos, e apesar da crise financeira internacional, o Governo animou-se com a correcção conseguida no défice público e com as eleições, garantindo um aumento salarial de 2,9 por cento, quando a taxa de inflação acabou por ficar, pela primeira vez em cinquenta anos, abaixo de zero.

Sector privado sob ameaça

No sector privado, é mais difícil verificar o que tem acontecido aos salários reais ao longo dos últimos anos. Os dados disponíveis dizem respeito às actualizações salariais decididas no âmbito de convenções laborais sectoriais. Uma parte muito grande dos trabalhadores não está incluída neste lote.

Ainda assim, é possível verificar, nos números disponibilizados pelo Ministério do Trabalho que durante a última década, os aumentos salariais no sector privado estiveram em linha com a inflação verificada, umas vezes com aumentos do poder de compra, outras vezes com perdas. Em 2009, também se verificou um ganho real significativo, relacionado com a queda quase inédita da inflação.

A questão que muitos portugueses agora colocam é se o facto de, em 2010, o Governo já ter decidido congelar os salários dos funcionários públicos e de poder estar prestes a anunciar a suspensão dos aumentos reais por mais três anos significa que, no sector privado poderá acontecer alguma coisa semelhante.

Os estudos académicos feitos sobre esta matéria revelam que existe uma relação moderadamente forte entre as actualizações salariais decididas no sector público e aquelas que, depois, são aplicadas no sector privado.

No entanto, muitos factores influenciam esta relação. Em especial, nas empresas, as actualizações salariais levam mais em conta a sua situação financeira específica ou do sector.

Governo não confirma

Ontem no Parlamento, a discussão da proposta de Orçamento do Estado - aprovada na generalidade, com as abstenções do PSD e do CDS - ~foi largamente ocupada pela possibilidade de um prolongamento da perda do poder de compra dos funcionários públicos.

PCP e Bloco de Esquerda criticaram a política de contenção salarial do Governo. PSD e PP exigiram que o Executivo discuta aquilo que está previsto no Programa de Estabilidade e Crescimento que será entregue em Bruxelas até ao final do mês. Pelo lado da bancada governamental, o ministro Jorge Lacão afirmou ser "uma especulação" a notícia da não existência de aumentos reais até 2013: "Vou responder de maneira muito singela: as noticias que aludem são especulações. E eu espero bem que a Câmara não se ocupe de especulações".

http://economia.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1422423

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