A CGTP-IN e os sindicatos mostram que a crise é um argumento perverso e insistem em mobilizar os trabalhadores para a luta, ainda mais necessária em empresas e sectores que recusam aumentar salários.
Enquanto o Governo dá ao patronato o pior exemplo, estimulando a imposição de perdas salariais aos trabalhadores, há números que revelam outro lado da «crise», como se salienta nos documentos que apelam à participação nas iniciativas da acção nacional descentralizada, que a CGTP-IN e os sindicatos estão a levar a cabo durante este trimestre. Sobressaem os dados sobre os lucros dos maiores grupos e sobre os salários dos administradores das empresas cotadas na Bolsa.
Estes últimos constam no «Relatório Anual sobre o Governo das Sociedades Cotadas em Portugal», recentemente divulgado pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, que analisa o exercício financeiro de 2008. Segundo a CMVM, cada administrador executivo das empresas que integram o PSI 20 recebeu, em média, 777 mil euros naquele ano, o que significa quase 65 mil euros por mês e 2 129 euros por dia. Representa também o valor de 136 meses de salário mínimo nacional.
Os lucros referentes aos três primeiros trimestres de 2009 são mais conhecidos, mas não menos escandalosos (especialmente, quando alguns dos muito poucos que recebem o maior quinhão da riqueza vêm defender o congelamento das remunerações dos trabalhadores que produzem essa riqueza). Lembra a CGTP-IN que, naqueles nove meses:
- cinco bancos (Santander Totta, BES, CGD, Millenium BCP e BPI) obtiveram, no total, 1 603 milhões de euros de lucro líquido, o que representa 178 milhões de euros por mês e quase 6 milhões por dia;
- doze grupos económicos (EDP, PT, Cimpor, GALP, Jerónimo Martins, Brisa, Sonae SGPS, REN, Mota Engil, Portucel, Semapa e ZON) alcançaram mais de 2400 milhões de euros de lucro líquido (267 milhões por mês e quase 9 milhões por dia).
É justo protestar
No sector do vidro de embalagem, os trabalhadores «estão indignados, perante as propostas salariais apresentadas pelas administrações». Segundo a Federação dos Sindicatos da Construção, Cerâmica e Vidro (Feviccom/CGTP-IN), as empresas «assumiram uma posição de fuga às negociações» com a federação e com o Sindicato dos Vidreiros e «anunciaram internamente os seus propósitos de processar entre zero, meio e um por cento sobre os salários em vigor». São indicadas as empresas Santos Barosa e Gallovidro, na Marinha Grande; Saint-Gobain Mondego, na Figueira da Foz; e o Grupo BA-Vidro (com fábricas em Avintes e na Marinha Grande e que integra também a Sotancro, na Amadora).
Depois de «anos consecutivos», em que «2009 não foi excepção», «a acumularem lucros de milhões, as empresas de um dos subsectores mais rentáveis da indústria vidreira nacional recorrem à chamada crise, para não distribuírem nem partilharem a riqueza criadas pelos próprios trabalhadores». A federação recorda ainda, numa nota que divulgou à comunicação social na semana passada, que «todas» aquelas empresas «estão entre as melhores e mais rentáveis do sector e do País»; «receberam apoios do Estado em milhões de euros, para investimento e modernização»; e «continuam em posições de realce no crescimento de vendas e de lucros», entre outros indicadores.
Em plenários, os trabalhadores vão decidir «medidas a tomar em breve», adianta a Feviccom.
Os cerca de 90 trabalhadores da Natural, Indústria de Papel, em Povolide (Viseu), vão igualmente analisar a resposta da gerência à reivindicação de mais 25 euros nos salários de 2010. O Sindicato das Indústrias de Celulose, Papel, Gráfica e Imprensa, da CGTP-IN, revelou segunda-feira que a empresa, embora reconhecendo que a proposta sindical «tinha lógica», pois seguia o valor da actualização do salários mínimo nacional, ficou-se por uma contraproposta de um por cento (que representa cinco ou seis euros para a maioria do pessoal) e não pretende aumentar as diuturnidades nem o subsídio de alimentação.
Segundo o sindicato, esta proposta patronal representaria mais 12 euros nos salários, se o aumento de um por cento na massa salarial fosse distribuído por igual. Para corresponder aos 25 euros reivindicados, os custos da empresa com pessoal cresceriam pouco mais de dois por cento. Os trabalhadores não tiveram qualquer actualização salarial em 2009.
Igualmente sem aumentos salariais no ano passado, os trabalhadores da Papeleira Portuguesa, em São Paio de Oleiros (Santa Maria da Feira), reivindicaram mais 30 euros para 2010. Sem contraproposta da empresa, que deveria ter sido apresentada em Dezembro, o sindicato requereu a conciliação, mas a administração não compareceu nem justificou a ausência.
Para o Sindicato dos Trabalhadores Consulares e das Missões Diplomáticas, é «natural» que os funcionários dos serviços externos do Ministério dos Negócios Estrangeiros «venham a desenvolver formas de luta», face à intenção do Governo de congelar os salários em toda a Administração Pública. Em média, salienta o STCDE, a perda de poder de compra daqueles trabalhadores foi o dobro da verificada em Portugal. Além disso, a carreira está congelada há uma década, sem um único concurso para promoção, «deixando os serviços sem vice-cônsules e chanceleres», enquanto o contestado SIADAP impede a progressão por mérito desde 2004.
O sindicato afirma ainda que, «um pouco por todo o Mundo», em missões, embaixadas, serviços consulares e centros culturais, há cerca de 230 trabalhadores com salários inferiores ao salário mínimo nacional.
«A esmagadora maioria» dos trabalhadores do sector ferroviário deveria ter visto os seus salários aumentados no dia 1 de Fevereiro, mas o SNTSF/CGTP-IN ainda não recebeu as contrapropostas das empresas. O sindicato apelou à unidade, pela exigência do crescimento dos salários, recordando que «são dos mais baixos da União Europeia», e adiantou que «vamos, a partir dos locais de trabalho, unir esforços no sentido de dar força à luta de todos».
Próximas acções de luta
No âmbito da acção nacional descentralizada, que culmina a 26 de Março, com a manifestação da juventude trabalhadora, em Lisboa, teve lugar ontem uma concentração em Viseu, junto ao edifício da Segurança Social, seguida de deslocação ao Governo Civil.
Das acções anunciadas para este mês, destacam-se:
- amanhã, em Lisboa, protesto de representantes dos trabalhadores da química, metalurgia e indústrias eléctricas, junto de associações patronais e do Ministério do Trabalho, a partir das 14 horas; em Oliveira do Hospital, greve de 24 horas, na Eurest;
- no dia 18, quinta-feira, em Aveiro, concentração junto à Segurança Social;
- no dia 20, sábado, em Faro, concentração junto ao liceu, pelas 15.30 horas, seguindo-se um desfile pelas ruas da cidade;
- no dia 22, segunda-feira, na Guarda, concentração frente ao Centro de Emprego, seguida de «cordão humano», em direcção à delegação da ACT e ao Governo Civil;
- no dia 25, quinta-feira, em Leiria, acções de protesto junto de empresas com salários em atraso e uma concentração distrital; concentração de trabalhadores do distrito de Lisboa, às 15 horas, frente ao Ministério do Trabalho, antecedida de concentrações sectoriais; greve nacional das cantinas e refeitórios, com concentração frente à sede da associação patronal (AHRESP), às 11.30 horas; plenário distrital de sindicatos em Évora, seguido de deslocação ao Governo Civil, cerca das 16 horas;
- no dia 26, sexta-feira, às 15 horas, concentração na Praça 8 de Maio, em Coimbra, seguida de manifestação até ao Governo Civil;
- no dia 27, na Covilhã, manifestação, com saída do largo junto ao GIR (Bairro do Rodrigo).
http://www.avante.pt/noticia.asp?id=32482&area=4
À procura de textos e pretextos, e dos seus contextos.
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