Hugo Janeiro
Fernando Melo, administrador da Groundforce, deu uma entrevista ao Público onde revela o aparecimento, «nas últimas semanas», de «potenciais interessados» na compra da sociedade. Em cima da mesa encontram-se «propostas [cinco, no total] que estão a ser analisadas, havendo nesta altura condições que fazem prever um desfecho breve». Estas propostas, acrescentou, vieram à luz do dia depois da decisão do encerramento da unidade de negócio de Faro, medida que tornou a empresa «mais atractiva».
Percebe-se que para o capital uma empresa é tanto mais apetecível quanto menor for a massa salarial dos respectivos trabalhadores, ou seja, quanto maior for a extorsão da mais-valia.
Mas atentemos noutras declarações de Fernando Melo ao referido periódico. De acordo com o administrador, a situação da unidade de Faro tornou-se «insustentável» devido aos elevados salários dos trabalhadores, os quais estão, alegadamente, na base dos enormes prejuízos da Groundforce. Por isso, frisa, tais «escândalos» deverão ser corrigidos pela renegociação do Acordo de Empresa e a consequente aceitação, por parte dos sindicatos, de «tudo o que estamos a propor». O administrador aduziu igualmente que a resolução do défice passa também pelo aumento da produtividade e eficiência com recurso à contratação de menos temporários.
Na mesma entrevista, Fernando Melo lembra ainda que, «com a abertura do mercado, entrou um novo operador que fez com que houvesse um decréscimo dos preços». E questionado sobre se a liberalização definitiva do sector e a manutenção de apenas um operador estatal (a Portway) seria o cenário ideal, respondeu que sim, sobretudo se a Groundforce fosse 100 por cento privada, algo que levaria até – vejam só – a que deixasse de haver «incumprimento das regras comunitárias».
Depois de afirmar, na mesma entrevista, ter «uma missão» que «não é a de vender a empresa», e de ter admitido que foi a «abertura do mercado» que baixou o valor cobrado nas operações da empresa, optando, porém, por verter ódio de classe sobre os trabalhadores e as suas remunerações, é caso para perguntar: em que é que ficamos?
Ficamos no mais do mesmo que tem arruinado o País, isto é, não basta uma empresa ser parcialmente entregue ao capital privado. E ser totalmente pública então nem se fala. Bom mesmo é estar no «mercado comum» daqueles para quem tudo vale em nome do lucro.
Claro que para a empresa ser «rentável» como as demais competidoras; tão rentável, mas tão rentável que os interessados façam fila para a adquirir, alguém tem de pagar o decréscimo dos custos. E quem senão os trabalhadores para suportar a factura? Sim, esses malandros cujos salários arruinam as empresas, cuja produtividade e eficiência pode e deve ainda ser mais e melhor esmifrada?
Tudo isto, teve a lata de dizer o administrador, para que o futuro dos filhos dos trabalhadores esteja «assegurado» e não amarrado a «acordos de empresa antigos», negociados por «sindicatos que foram sempre agressivos nas negociações, com alguma irresponsabilidade», e «administrações [da TAP] que cederam para não se chatearem».
Para assegurar o futuro? Pode ser. Mas de quem?
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