Bonificação do Estado é anulada por agravamento no seguro de vida
Mais de 400 euros por mês. Era quanto Bruno, 31 anos, pagava todos os meses pelo seguro de vida que precisava por causa do crédito à habitação. O agravamento da apólice era de 1000%, devido à sua deficiência, e superava largamente a bonificação a que tinha direito no crédito. Por isso, acabou por queixar-se à Deco. É por continuar a receber queixas destas que a Provedoria da Justiça alerta para a discriminação de que são alvo os deficientes nos seguros para compra de casa.
O que está em causa, explica Miguel Coelho, responsável pela área dos assuntos judiciários na Provedoria, é o facto de a bonificação a que as pessoas com deficiência ou risco de saúde (por causa de doenças crónicas) têm direito quando fazem um crédito ser completamente "desvirtuada" por terem de pagar seguros de vida agravados por essa mesma incapacidade.
Isto quando encontram uma companhia que lhes faça um seguro de vida, já que alguns nem isso conseguem e por isso não têm acesso a crédito para comprar casa, sublinha Miguel Coelho.
Desde 1994 houve, pelo menos, 20 queixas de particulares na Provedoria da Justiça. A estas somam--se os pedidos de associações de deficientes e de entidades sindicais (como a CGTP), indica. Reclamações que levaram o provedor a sugerir ao Governo que desse orientações à Caixa Geral de Depósitos, cujo principal accionista é o Estado, para que as seguradores do grupo "não recusassem a celebração de contratos de seguro de vida associados a créditos à habitação nem agravassem os respectivos prémios" por causa de deficiências.
Mas recebeu como resposta que a legislação existente já assegura os direitos dos deficientes. No entanto, e porque a Provedoria continua a receber reclamações, o provedor Alfredo José de Sousa vem alertar novamente para esta discriminação. E pedir às pessoas afectadas para apresentarem queixas ao Instituto Nacional de Reabilitação.
Outra opção é que se crie um fundo que sirva para assegurar estes seguros. Uma sugestão que por razões económicas não foi acatada, conclui o responsável
"Temos queixas em que esse agravamento é de 1000% e o queixoso paga mais de seguro do que de prestação da casa", indica a jurista Ana Sofia Ferreira, da Deco. Também a Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor defende a criação de um sistema alternativo para segurar as pessoas cuja avaliação de risco resulta num prémio incomportável ou na recusa de fazer seguro - embora aproveite para lembrar que esta recusa é uma discriminação. Nos últimos quatro anos, a Deco mediou 11 processos deste tipo, recebeu mais 28 reclamações e cerca de 70 pedidos de informação.
No caso de Bruno, depois de se queixar à Deco e de se ter iniciado o processo de mediação, a seguradora aceitou reduzir o agravamento da apólice para 300% e reembolsar os valores pagos desde a entrada da queixa. Mas não recebeu os 4000 euros pagos anteriormente.
Anabela, de 56 anos, passou pela mesma situação. Com 65% de incapacidade depois de ser operada a um cancro na mama, viu a seguradora apresentar-lhe uma conta de cerca de 200 euros mensais. Com mais 80 do marido, o valor ficava muito perto da prestação da casa, que rondava os 300 euros. "Não pensei em discriminação, mas achei injusto e pensámos em desistir", conta. Depois, descobriram que havia a possibilidade de segurar apenas o marido - responsável pela maior fatia de rendimento do casal. Apresentaram a hipótese ao banco, que aceitou. A única forma que encontraram de contornar aquela "injustiça".
http://dn.sapo.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=1664517
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