Receitas foram cobradas, mas os doentes nunca acederam aos tratamentos.
A Inspecção-Geral das Activida-des em Saúde (IGAS) está a investigar vários casos de fraude no SNS, ligados à prescrição de me-dicamentos. Ao que o DN apu-rou, trata-se de casos de médicos a passar receitas em nome de doentes que nem sequer chegam a levantar os medicamentos, mas que depois são aviadas em farmácias distantes e cobradas ao Estado. Os casos, que também estão no Ministério Público (MP), envolvem remédios com 100% de comparticipação para pensionistas, entre outros. Recorde-se que o crescimento da despesa na área levou recentemente o ministério a anunciar o reforço das acções inspectivas.
Estas situações de burlas custam "centenas de milhares de euros" ao SNS e envolvem sobretudo medicamentos que possibilitam maiores margens de lucro e elevadas comparticipações. Nos últimos dois anos, foram investigadas mais de 12 situações diferentes na área dos gastos com medicamentos (ver caixa ao lado).
Há pelo menos três casos que envolvem médicos e farmácias e que estão a ser investigados também pelo MP. Todos eles têm em comum a mesma farmácia, que registou um aumento elevado e súbito da facturação, indício que levanta suspeita de irregularidade.
Numa das situações, identificou-se um médico que prescrevia receitas em nome dos seus doentes ou familiares e depois as receitas eram aviadas sempre na mesma farmácia, que ficava a mais de cem quilómetros de distância da morada dos doentes. No entanto, nenhum dos doentes comprou a medicação prescrita. Quando os utentes foram contactados - muitos deles eram idosos - disseram que nunca tinham visto as receitas, não as assinaram e nem sequer tomavam aquela medicação. Custo para o Estado: 89 mil euros.
O segundo caso relatado ao DN envolveu outro clínico, 55 mil euros de gastos e o total desconhecimento dos doentes que viviam ainda mais longe da farmácia que enviava as contas para o SNS. O terceiro é ainda mais caricato, porque o clínico envolvido prescre-via medicamentos a doentes que nem eram da sua lista. As cinco receitas passadas foram assinadas, entre outros, por um doente que não sabia ler nem escrever...
Ao todo, estes casos envolveram 119 receitas, quase 200 mil euros relativos a remédios na sua maioria comparticipados a 100%, seja a pensionistas que recebem menos do que o ordenado mínimo ou a outros utentes que têm isenções. Os casos que estão em investigação no MP (por indícios de crime) e na IGAS (dois deles em fase de contraditório e um na fase de acusação em termos disciplinares) permitem ganhos avultados para ambos os lados, porque os remédios não saíam da farmácia e os valores eram pagos pela ARS. Outra possibilidade é estes remédios serem cobrados e vendidos noutros países a preços mais elevados (exportação paralela).
O Ministério da Saúde mostrou preocupação com estes casos, já que "estão também associados a um aumento da despesa com medicamentos em ambulatório". Além dos casos referidos, há suspeitas de que haja doentes isentos, como os pensionistas, a pedir ao seu médico remédios para amigos ou familiares. Uma situação que incrimina o médico porque os passa e a farmácia e as ARS quando não conferem as receitas.
Há ainda doentes isentos de pagamento por várias razões, nomeadamente por terem determinadas doenças com esse estatuto, como lúpus. Para não pagarem, os médicos põem na receita a lei da isenção. Porém, há farmácias que colocam as portarias após a venda, cobrando mais ao Estado e aumentando o lucro.
http://dn.sapo.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=1652574
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