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04/04/2011

Mais de um terço das empresas nacionais apresentaram prejuízos fiscais em 2009

João Ramos de Almeida

Cerca de 37 por cento das empresas nacionais apresentaram prejuízos fiscais em 2009, num valor que ultrapassou os 12 mil milhões de euros.

Os números mais recentes das estatísticas divulgadas pela administração fiscal revelam uma trajectória crescente desde 2004.

O número das empresas envolvidas subiu a um ritmo anual de 6,4 por cento e no seu total acumularam nesse período prejuízos de 63,8 mil milhões de euros. A importância de quantificar estes prejuízos fiscais é o facto de dar uma ideia de como a receita futura do IRC pode vir a estar condicionada.

As empresas têm prejuízos em resultado de situações económicas desfavoráveis. Mas pode haver um interesse na apresentação ao fisco de valores negativos. Como explicam os dirigentes tributários, o prejuízo tem dois efeitos fiscais. Primeiro, essas empresas não pagam o IRC nos exercícios em que declaram prejuízos. E depois, através do mecanismo legal de reporte de prejuízos (existente na generalidade dos países), essas empresas abatem esses prejuízos acumulados aos eventuais lucros nos exercícios seguintes e, com essa redução, pagam menos IRC.

Menos abatimentos

Até 2010 era possível abater prejuízos nos seis exercícios seguintes, mas desde então esse número foi reduzido para quatro, como forma de limitar a manipulação de resultados negativos. Mas essa medida limita apenas o fenómeno. Só para se ter uma ideia, em 2009 os prejuízos fiscais acumulados representaram metade dos lucros tributáveis desse ano. De 2004 a 2009, foram 42 por cento do lucro tributável nesse período.

O mais espantoso, quando se olha para as séries longas de valores, é verificar que os valores de 2009 estão em linha com uma longa trajectória detectável nas duas últimas décadas. De 1989 a 1996 somaram 35 mil milhões de euros. De 1997 a 2002 atingiram os 53 mil milhões de euros. E de 2003 a 2009 chegaram aos 72,5 mil milhões de euros.

Talvez por isso, a receita de IRC tem-se mantido desde 1998 em valores que oscilam entre 3 e os 4 mil milhões de euros e está fortemente dependente, ao longo de todos estes anos, dos "grandes contribuintes", sem que as medidas de combate à fraude e evasão fiscais consigam inverter essa tendência.

Os prejuízos fiscais verificam-se ao longo de todo este período, independentemente dos ciclos económicos, nos mesmos sectores e nos mesmos grupos de contribuintes. Um pouco menos de um terço do valor dos prejuízos fica nas empresas com proveitos até 500 mil euros. O outro terço reparte-se em partes iguais entre as empresas com proveitos entre 500 mil e 1,5 milhões de euros, entre 1,5 e 5 milhões e entre 5 e 25 milhões de euros. Finalmente, o terceiro terço dos prejuízos está nas empresas com proveitos acima dos 25 milhões de euros.

E em que sectores se verifica a maior concentração de prejuízos? Pelo valor, a distribuição tem sido semelhante ao longo da última década. Oitenta por cento dos 112 mil milhões de euros de prejuízos acumulados de 1999 a 2009 verificaram-se numa meia dúzia de sectores: imobiliário (24 por cento do total), comércio (17 por cento), indústria transformadora (12 por cento), transportes e comunicações (11 por cento), actividades financeiras (10 por cento) e construção (6 por cento).

A distribuição já é outra caso se analise pelo número de empresas. Mas mais uma vez, a distribuição ocorre, similar, ao longo dos anos da última década e mesmo em 2009. Nesse ano, cinco sectores concentraram 80 por cento do total das empresas com prejuízos. São aquelas actividades que, habitualmente, são apontadas como tendo más práticas fiscais. Primeiro é o comércio, com 27 por cento do total dessas empresas. A seguir, as actividades imobiliárias, com quase 21 por cento. Depois vem a construção, com 12 por cento e, em quarto lugar, dois sectores, cada um com 10 por cento - a hotelaria (alojamento e restauração) e a indústria transformadora no seu conjunto (a DGCI deixou de facultar números por ramos de actividade industrial).

Os dirigentes da administração fiscal estão cientes deste fenómeno. Mas os instrumentos de que dispõem estão aquém da dimensão dos prejuízos acumulados. O pagamento especial por conta, que pode funcionar como uma colecta mínima, permitiu a arrecadação em 2009 de 30 milhões de euros pagos por 162,2 mil empresas (um valor médio de 184 euros por empresa).

As derramas que incidem sobre os lucros não atingiram os 268 milhões de euros e incidiram sobre 154,1 mil empresas (1739 euros por empresa). E a tributação autónoma sobre despesas confidenciais foi, em 2009, de 371 milhões de euros sobre 161,2 mil empresas (2301 euros por empresa). Montantes nada comparáveis com os 12 mil milhões de euros de prejuízos contabilizados em 145,4 mil empresas (83 mil euros por empresa).

http://economia.publico.pt/Noticia/mais-de-um-terco-das-empresas-nacionais-apresentaram-prejuizos-fiscais-em-2009_1488134

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