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17/03/2011

Banca acumula lucros e reduz impostos

José Alberto Lourenço

Nas últimas semanas têm vindo a ser divulgados os resultados obtidos em 2010 pelos maiores grupos económicos nacionais, entre os quais se destacam os quatro principais bancos privados (BES, BCP, Santander Totta e BPI).
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Foi assim que soubemos que estes quatro bancos, em conjunto, tiveram em 2010 lucros líquidos (lucros após o pagamento dos impostos) de 1431,6 milhões de euros, depois de em 2009 terem atingido os 1445,7 milhões. Num caso como noutro falamos de cerca de 3,9 milhões de euros por dia de lucros arrecadados.
Foi assim também que constatámos que apesar de o BCP, BES, Santander Totta e BPI terem mantido os seus lucros líquidos ao nível de 2009, tiveram «arte e engenho» para conseguir reduzir o nível de IRC pago para menos de metade. Enquanto em 2009 estes bancos pagaram ao Estado, de IRC, 306,5 milhões de euros, em 2010 o IRC pago baixou para 138,6 milhões de euros (- 167,9 milhões de euros).
Perante estes resultados, logo os banqueiros se apressaram a vir tentar explicar o que se passou. Foi assim porque a actividade no exterior subiu muito, dizem eles, ou seja, pretendem fazer-nos crer que a baixa carga fiscal paga resultou de grande parte dos resultados terem sido obtidos no exterior, com uma menor carga fiscal.
Ora a leitura desagregada dos resultados vem demonstrar precisamente o contrário: se não fosse o imposto pago por estes bancos sobre a actividade desenvolvida no exterior, eles não teriam pago impostos em 2010. Parece mentira, mas é verdade; só a actividade desenvolvida no exterior pelos três deles – o Santander/Totta apresenta apenas actividade doméstica (actividade no interior do país) –, permitiu que pagassem IRC em 2010, já que da actividade doméstica desenvolvida resultou «um crédito fiscal», ou seja, não pagam por essa actividade qualquer valor de IRC.
A pergunta que não pode deixar de ser feita perante os elevados lucros realizados por estes bancos e a reduzida carga fiscal paga, é a de como é que isto é possível. Mais, como é que tal coisa é possível no momento que vivemos, em que se exige às classes trabalhadoras e ao povo enormes sacrifícios, que passam pelo aumento do IRS e do IVA, pela redução dos valores do subsídio de desemprego e das condições de acesso ao mesmo, pela redução e congelamento de salários no Sector Público do Estado e das pensões e reformas, pela diminuição dos vários apoios sociais às famílias e por cortes na Saúde e na Educação?
É uma situação verdadeiramente escandalosa, esta, que permite a estes bancos pagar em 2010 uma taxa efectiva de IRC de 7,5%, quando deveriam pagar uma taxa de 25%, como propõe o PCP. Só nestes quatro bancos, a diferença entre o que pagaram e o que pagariam à taxa de 25% significa uma perda para os cofres do Estado de 325,7 milhões de euros.
Ricardo Salgado, presidente do BES e um dos mais conhecidos banqueiros nacionais, já se apressou a desmentir que o seu banco tivesse só pago 43,7 milhões de euros de impostos, dizendo que pagou isso de IRC e que pagou também muito mais de outros impostos. Desta forma pensa que consegue enganar os portugueses, confundido deliberadamente o IRC, que corresponde ao imposto sobre os lucros, com outros impostos que tanto são pagos pelas empresas como pelos trabalhadores.
Como se os trabalhadores portugueses para além do IRS – imposto sobre pessoas singulares –, que incide sobre os seus rendimentos do trabalho, não pagassem também IVA como consumidores, não pagassem também IVVA quando adquirem um automóvel, não pagassem também imposto sobre o tabaco quando fumam, não pagassem também imposto de circulação pela utilização anual da sua viatura automóvel, não pagassem também imposto sobre produtos petrolíferos quando abastecem a sua viatura, não pagassem também IMI quando são donos do imóvel onde habitam, etc, etc...
Estes senhores detentores do poder económico e verdadeiros mandantes do País querem fazer de nós parvos e pensam que não sabemos que são eles os grandes beneficiários do chamado planeamento fiscal e dos benefícios fiscais de que tanto se fala, quando se discute a injusta política fiscal que temos tido nas últimas décadas.
Numa situação de profunda crise económica e social como aquela que vivemos, assistimos por parte dos principais bancos privados nacionais à demonstração da sua verdadeira face, da sua completa insensibilidade social, tudo fazendo para aumentar os lucros obtidos, quer pela subida dos juros e comissões cobradas nos empréstimos concedidos, quer pela diminuição dos impostos pagos. Como reconhecia Ricardo Salgado, numa recente entrevista ao Expresso, «os administradores …são pagos não para fazer filantropia, mas para obter, dentro do que é legal, a maximização dos resultados» , e « ..o sistema capitalista é amoral, tem de produzir resultados». Há muito que o sabemos e por isso lutamos pelo seu fim.

http://www.avante.pt/pt/1946/temas/113017/ 

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