Após a avalanche dos gigantes têxteis do Vale do Ave que, na década de 90, se enrolaram em dívidas e desmoronaram, foi a vez de pequenas e médias empresas do sector começarem a despedir e a encerrar. Em 2010, fecharam perto de 20 só em Santo Tirso e Trofa.
O número, que parecerá parco tendo em conta a crise e o facto de servir dois concelhos, depressa assume proporções de um monstro que assombra centenas de famílias: significa que cerca de meio milhar de trabalhadores mergulharam no fundo de desemprego. Muitos deles, sem perspectivas de emergir para a vida activa.
Como Arlindo Martins, que laborou 20 anos na fiação da Arco Têxteis - uma das maiores de Santo Tirso, a par da Flor do Campo ou JMA - e está, desde Agosto passado, sem trabalho e sem esperanças de encontrar algum. Qualquer que seja, porque, volvido quase meio ano, selectividade é, apenas, letra morta para quem desespera: "Já percorri esta zona toda e Paços de Ferreira inteiro, onde tentei marcenaria e outras coisas, e não consigo arranjar nada".
Aos cerca de 50 operários da Arcofio (empresa satélite da Arco dotada de "tecnologia avançada" em 2001 e que seria, nove anos depois, reabsorvida pelo grupo-mãe e encerrada em poucos meses) juntaram-se os perto de 450 somados de notícias publicadas no JN ao longo de 2010 e de números do Sindicato dos Trabalhadores dos Sectores Têxteis, Vestuário, Calçado e Curtumes do Porto (Sintevecc). De fora ficarão os que não chegam a tingir páginas de jornais - aqueles que não recorrem aos sindicatos ou a advogados para reclamar indemnizações.
"Neste sector, a crise não é agora. Foi no final dos anos 80 e na década de 90. Essa, arrasou muitas firmas. O que cresce depois disso são as micro e pequenas empresas, que são flutuantes", analisa a sindicalista Palmira Peixoto. "Em 1996, havia 9786 empresas de têxtil, vestuário e calçado [no país]. Em 2007, ia em 10161, o que é uma contradição, porque a quantidade de empresas que encerraram nos anos 90 foi um absurdo. Então, como é possível haver ainda mais agora?", questiona.
O Sindicato Têxtil do Porto avança, ainda, outro dado: a esmagadora maioria das firmas (60,4%) têm entre um e nove operários, sendo que 91% têm menos de 50. "O que cresce são as microempresas, que são subcontratadas de subcontratadas e flutuantes, pois são criadas hoje e podem aguentar meia dúzia de meses", nota a dirigente sindical.
Para Palmira Peixoto, este aumento tem duas explicações: se, por um lado, "o facto de a burocracia ter acabado permitiu que se criem empresas na hora, sem ver o que está por detrás", por outro, "a maior parte é criada para dar saída ao fluxo de encomendas que as grandes e médias empresas têm". E, quando as firmas mais pequenas "não têm capacidade para cumprir as encomendas, subcontratam outra, esmagando ainda mais os preços para terem lucro", explica, acrescentando: "As fábricas não encerram por falta de encomendas. Elas estão cheias de trabalho, a fazer horas extra".
"A crise não justifica o encerramento de pequenas e médias empresas. Muitas fecham e abrem ao lado, com outro nome", alerta a sindicalista, sublinhando a necessidade de "fiscalização efectiva".
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