Margarida Davim
Manuela conta que nas últimas três semanas esteve todos os dias 12 horas na escola. Ao trabalho pedagógico, somaram-se horas de reuniões com pais – «que deviam ser só 45 minutos por semana, mas que se arrastam sempre» – e o trabalho relacionado com a avaliação do desempenho docente.
No fim disto tudo, pouco tempo sobra para a família. «Há um desgaste. Porque levamos os problemas para casa». Nas últimas noites foi um aluno de etnia cigana que lhe tirou o sono. «Tem grandes capacidades intelectuais, mas falta muito e a mãe é conivente com isso». Preocupada, já organizou um encontro com os pais para debater a situação.
Lina Oliveira, professora em Pombal, sabe bem o que é ter de ir buscar um aluno a casa. Nos últimos três anos, a professora de Português fez várias vezes o percurso para casa dos avós de um dos seus alunos, na esperança de o convencer a não faltar. No último ano perdeu a batalha: «No 9.º ano não consegui e ele ficou retido por faltas».
Outra guerra perdida, no ano passado, fez com que a turma de que era directora acumulasse mais de 50% de reprovações. «Eram alunos muito complicados, que somaram mais de 200 participações disciplinares».
Lina perdeu a conta às vezes que falou com eles e chamou os pais à escola. «Mas eles recusavam-se em participar em algumas das aulas, apesar de na minha aula terem um bom comportamento». A professora fez-se amiga deles no Facebook, ligava-lhes para o telemóvel e conheceu todos os encarregados de educação, mas nem a ligação especial melhorou o comportamento.
Com 20 anos de serviço, o desgaste destas derrotas levou-a, este ano, a tirar uma licença sem vencimento «para reflectir e descansar». Não se esquece da vocação que a levou a escolher a docência, mas não esconde a vontade de mudar de vida. «Se pudesse, escolhia uma profissão onde os resultados fossem mais controlados por mim», diz, lembrando a pressão cada vez maior que os docentes têm para conseguir sucesso.
Com cortes salariais que levam a uma redução de quase 30% no vencimento e desgastados pela avaliação do desempenho, os professores não escondem que é cada vez mais difícil manter a motivação. «Damos tudo pela profissão, pelos miúdos, e sentimo-nos cansados e desmotivados», comenta Isabel Parente, que acha que «em geral, a sociedade não se apercebe deste trabalho que os docentes fazem».
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