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25/04/2011

25 de Abril: Irene Pimentel: “Todos os portugueses”, e não só Otelo, “são donos” da Revolução

A historiada Irene Pimentel não gostou das declarações recentes de Otelo Saraiva de Carvalho, que disse que, se soubesse como o país ia ficar, não teria feito a Revolução, contrapondo que “todos os portugueses são donos do 25 de Abril”.

Numa entrevista recente à agência Lusa, o capitão de Abril Otelo Saraiva de Carvalho afirmou: “Não teria feito o 25 de Abril se pensasse que íamos cair na situação em que estamos actualmente.”
“Detestei essa declaração”, reconhece Irene Pimentel. “É como se Otelo Saraiva de Carvalho fosse dono de um movimento que implicou muitas pessoas, e não só militares”, contesta, em entrevista à agência Lusa.
“As situações políticas têm recuos, têm avanços. O que nós devemos fazer é tentar que não se recue demasiado e se avance cada vez mais”, argumenta a investigadora que se tem dedicado ao período do Estado Novo.
E Otelo Saraiva de Carvalho disse “pior”, disse que “é muito fácil derrubar um governo” e “ameaçou que se as chefias militares fossem atingidas pela crise talvez pudessem sair à rua”. Ora, “não está a distinguir o governo que ele ajudou a derrubar, ditatorial, do governo atual, que, por enquanto, com todos os seus erros, ainda é uma democracia”, critica.
Irene Pimentel considera que “esse tipo de ameaça não fica nada bem” – “doutra pessoa diríamos que era um antidemocrata; de Otelo é mais difícil dizer, mas que está a defender uma postura antidemocrática, isso está”.
Quanto à decisão de não se celebrar este ano o 25 de Abril no Parlamento, a historiada diz que acha “muito mais interessantes as comemorações populares, de rua, espontâneas, do que as comemorações institucionais”, em que “ostensivamente uma parte da Assembleia da República não traz o cravo vermelho, inclusive o Presidente da República”.
E estima que este ano as manifestações populares sejam “muito concorridas, porque há muitas razões para as pessoas irem para a rua e reactualizarem os valores do 25 de Abril”.
Sublinhando que sempre foi “contra a abstenção”, Irene Pimentel, que integra o conselho coordenador do Fórum Novas Fronteiras, do PS, reconhece que “é complicado” ir votar nesta altura. “As pessoas vão votar em quê? Em pessoas que nos vão representar e que vão moldar o regime ou o governo que nós queremos, ou estamos neste momento a ser dirigidos por qualquer coisa de estrangeiro, como o FMI, que pode até impor governo, leis, tudo, que não seja escolhido por nós?”, questiona.
“Os partidos – que, por enquanto, eu ainda acho que são fundamentais na democracia – já não representam o total das pessoas, ou representam cada vez menos”, admite, explicando assim o surgimento de novos grupos, como o Movimento 12 de Março (M12M), mas realçando que para um historiador “é difícil prever o que vai acontecer”.
“O voto em branco, hoje, em dia, devia ser contabilizado. Muitas pessoas, que não são abstencionistas, não se reconhecem nos partidos que se candidatam”, sustenta, concordando com o constitucionalista Jorge Miranda, que, numa entrevista recente à rádio Antena 1, disse que deviam ser deixados no Parlamento lugares vagos provenientes dos votos em branco.
“Estamos num momento de encruzilhada grave”, resume Irene Pimentel, que já recebeu diversos prémios pelos livros que escreveu, entre eles o Prémio Pessoa, em 2007.
Preocupada com a ascensão dos movimentos de extrema-direita na Europa e descrevendo-se como “profundamente antinacionalista”, a historiadora apela à criação de um “novo tipo de internacionalismo”.
“Nunca percebi, por exemplo, como é que os vários povos – o grego, o irlandês, o português – não se manifestam na rua contra as agências de rating, que é uma coisa concreta. Evidentemente não podemos só culpar as agências de rating, mas essas contribuíram para o nosso buraco”, diz.

http://www.destak.pt/artigo/93529-irene-pimentel-todos-os-portugueses-e-nao-so-otelo-sao-donos-da-revolucao

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