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08/10/2010

Greve geral por sacrifícios iguais para todos

João Ramos de Almeida

É difícil conciliar numa mesma acção sensibilidades sindicais tão diferentes como as da CGTP e da UGT. As medidas de austeridade conseguiram-no. No dia 24 de Novembro haverá greve geral.
A greve geral está marcada para 24 de Novembro. As direcções das duas centrais sindicais ainda vão redigir um pré-aviso comum, centrado na luta contra as medidas de austeridade e por um Orçamento do Estado (OE) que contemple uma justa repartição dos sacrifícios. Mas o Governo parece querer acelerar a aprovação do OE antes da paralisação geral.

Seguindo os sinais conhecidos, os secretários-gerais da CGTP e da UGT anunciaram ontem a intenção de realizar uma greve geral conjunta, a segunda desde a criação da UGT em 1978. A primeira foi em 1988 e travou o Governo maioritário de Cavaco Silva de mudar radicalmente a legislação laboral (ver texto).

Ontem, o anúncio foi antecedido de uma reunião de duas horas, na sede da UGT, entre as direcções das centrais. Foi o primeiro encontro das cúpulas e materializou várias iniciativas de aproximação entre estruturas sindicais.

João Proença afirmou ao PÚBLICO que a reunião correu bem e que houve uma identidade de posições quanto aos objectivos da greve. A reunião, como afirmou, serviu para fixar os seus objectivos, a concretizar no pré-aviso. Mas a conferência de imprensa que se seguiu traçou já o entendimento conseguido.

CGTP moderada, UGT dura

A greve geral não visa a queda do Governo - como pretendia João Proença -, mas sim mobilizar a sociedade portuguesa para mudar as políticas de austeridade. CGTP e UGT não querem inviabilizar o OE; querem outro OE de 2011, sem este PEC que, consideram, concentra os sacrifícios nas pessoas de mais baixos rendimentos e que irá provocar uma recessão económica, prejudicando a criação de emprego e a redução do desemprego.

Na exposição dos motivos, Carvalho da Silva apareceu com um discurso moderado e foi João Proença quem usou palavras mais veementes.

"É fundamental dizer claramente ao Governo, aos partidos políticos, à opinião pública, que é fundamental mudar de políticas, combater as desigualdades sociais em Portugal, que os sacrifícios sejam repartidos de uma maneira justa por toda a sociedade e não se concentrem nalguns", afirmou Proença.

"Há uma pressão enorme para a redução da retribuição do trabalho", "a vida no trabalho está a ser infernilizada e isto tem de ter uma resposta", afirmou Carvalho da Silva, que mais adiante acrescentou: "Estamos convencidos que iremos ser capazes de fazer um trabalho de esclarecimento, mobilização, de diálogo com a sociedade. Não queremos fazer uma greve distanciada da sociedade".

Sobre a queda do Governo, Carvalho da Silva foi seco: "Essa questão nunca foi colocada." Proença declarou: "As medidas de austeridade são necessárias; o problema é que só atingem alguns, as pessoas de mais baixos rendimentos."

E os mercados como vão entender a greve? "Só podem interpretar de uma maneira", começou Proença: "Há um limite aos sacrifícios." E acrescentou: "Os governos não podem ficar de joelhos face às imposições das instituições internacionais".

Mas querem que o OE não seja aprovado? "O país precisa do OE", respondeu Proença. E os dois sindicalistas alinharam logo ali um conjunto de medidas alternativas - tanto nas receitas como nas despesas. Antes, Proença já tinha questionado as opções do Governo. "Houve uma medida que atacasse as grandes fortunas? Houve alguma medida que atacasse as transferências para os paraísos fiscais? Foi apontada uma taxa para o sector financeiro, mas um banqueiro já veio dizer que se a aplicarem são os consumidores que a vão pagar". Defendeu ainda um ataque à economia clandestina, um forte corte nos benefícios fiscais às empresas. "Quantas empresas pagam 25 por cento de IRC? E quantos bancos?"

Após o anúncio, há ainda muito trabalho para preparar a greve. Mas do lado do Governo, o ministro dos Assuntos Parlamentares libertou anteontem a indicação de que a aprovação do Orçamento do Estado irá ser acelerada. A sua proposta de OE para 2011 será apresentada até dia 15 de Outubro, mas o Parlamento terá menos tempo para a discutir.

A discussão e votação da lei na generalidade realizar-se-á a 29 de Outubro próximo e não na primeira semana de Novembro, antes de baixar à comissão especializada. A interpretação dos sindicalistas é a de que o Governo quer esvaziar a greve geral, aprovando o OE o mais rapidamente possível. Mas as centrais sindicais vão tentar encontrar apoios na oposição para o obstar. A luta contra o tempo começou.

http://economia.publico.pt/Noticia/greve-geral-por-sacrificios-iguais-para-todos_1460018

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