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28/10/2010

Cortes drásticos no Reino Unido: Razia social

O governo de conservadores e liberais do Reino Unido anunciou, dia 20, um programa nunca visto, que prevê a eliminação de 500 mil postos de trabalho no sector público e cortes orçamentais no valor de 83 mil milhões de libras (95 mil milhões de euros).
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Uma redução tão brutal da despesa pública, combinada com um aumento de impostos na ordem dos 30 mil milhões de libras, provocará a destruição de mais 500 mil empregos no sector privado, agravará fortemente as condições de vida dos mais desfavorecidos e mergulhará a economia britânica numa profunda recessão.
Todavia, para o ministro das Finanças, George Osborne, descendente de uma família de industriais abastados, ele próprio detentor de uma fortuna avaliada em mais de 4,6 milhões de libras – não havia outra alternativa para «evitar a falência» do país.
E pouco lhe importa que o défice das contas públicas, que se eleva a 11 por cento do PIB (109 mil milhões de libras), tenha surgido após sucessivas e continuadas injecções de dinheiro do Estado para salvar a banca privada afundada em negócios especulativos.
Agora é tempo de o povo pagar não só o défice corrente, mas também a dívida acumulada do Estado que se eleva a 952 mil milhões de libras (64,6% do PIB).
Para tanto as despesas com a assistência social terão uma redução global de 18 mil milhões de libras, enquanto os ministérios sofrerão reduções orçamentais de 19 por cento em média.
O financiamento das autarquias locais desce 28 por cento, as universidades, 40 por cento, o sector da cultura e media, onde se inclui a BBC, terá de diminuir 41 por cento das despesas. As verbas para habitação social diminuem 60 por cento, o que colocará muitos britânicos a viver na rua, já que as rendas subsidiadas a que hoje têm direito irão subir até 80 por cento do valor de mercado.
Até os deficientes não escapam à razia social. As prestações por incapacidade laboral passam a ter a validade de um ano, findo o qual é obrigatório aceitar um emprego. A idade da reforma sobe aos 66 anos, são eliminados ou reduzidos os apoios aos estudantes, bem como as deduções fiscais por cada filho às famílias com fracos rendimentos. Só neste último item, Osborne espera ir buscar 2,4 mil milhões de libras.
De resto, segundo concluiu o Institute for Fiscal Studies (Instituto de Estudos Fiscais), o fardo maior do pacote de austeridade recairá sobre a metade mais pobre da população e em especial sobre os 10 por cento mais desfavorecidos. Basta ver que a subida prevista de impostos à banca é de 0,04 por cento, podendo atingir os 0,07 por cento.
Este tratamento preferencial ao sector financeiro não surpreende se nos lembrarmos que entre os 29 membros do actual governo britânico, 23 são milionários, onde se inclui o próprio primeiro-ministro, David Cameron, cuja fortuna foi recentemente estimada pelo Daily Mail em quatro milhões de libras.
Mais do que um programa de economias, o governo britânico propõe-se desmantelar todo o edifício do Estado providência, fazendo recuar a sociedade britânica para os tempos anteriores à II Guerra. Nem mesmo Thatcher foi tão longe.

Resposta tímida

Alguns jornais já compararam as actuais medidas com os sombrios anos 20 quando o aperto do cinto foi tal que provocou a greve geral de 1926 e uma crise do regime. Inevitavelmente a resposta das massas será forte nos próximos tempos, e o Trade Union Congress (TUC) já anunciou, no sábado, 23, estar a preparar a «maior» manifestação de sempre no Reino Unido. Mas a data do protesto parece demasiado distante: 26 de Março no Hyde Park. Até lá, o secretário-geral do TUC apelou à preparação da mobilização.
Intervindo num comício em Londres, Brendan Barber reconheceu que «o movimento sindical e o país enfrentam o mais sério teste desta geração». Todavia, reflectindo as divergências existentes nesta estrutura que reúne 58 dos maiores sindicatos do Reino Unido, contando com cerca de 6,5 milhões de associados, o líder do TUC evitou falar em greve geral.
Olhando para o exemplo da França, vários sindicatos sentem a necessidade de agir já de forma coordenada. Manifestações de protesto realizaram-se no sábado em Edimburgo, na Escócia, Wrexham e Cardiff, no País de Gales, Belfast, na Irlanda do Norte, bem como em Birmingham, Bristol, Cambridge, Lincoln, Londres, Manchester, Plymouth, Portsmouth, Yorkshire e York, na Inglaterra.

http://www.avante.pt/pt/1926/europa/111016/

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